quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Falta transparência em Guantánamo


Em “Caminho para Guantánamo” (Inglaterra/2006) de Michael Winterbottom, profícuo, irregular,versátil e incansável diretor inglês, fomos defrontados com todo horror desta prisão. O filme, que é bom, padece um pouco com o conformismo em criar imagens bastante fortes. Precisava ir além disto. Mas é um documento histórico apreciável.

Leio em O Globo de hoje as primeiras medidas governamentais de Barack Obama. Gostei bastante delas de modo geral, mas uma me desagradou profundamente:

“Determinação do fechamento da prisão de Guantánamo em um ano, mandando suspender os julgamentos por 120 dias”.

Gente, fechamento em um ano? Tinha que ser fechada totalmente imediatamente! Do jeito que está sendo conduzido há margem para queima de arquivos, continuidade de torturas no período de um ano, o que é uma lástima, pois os transgressores canalhas dos direitos humanos direta ou indiretamente têm de ser identificados, detidos e julgados. Ou não?

As medidas de transparência de seu governo são ótimas, mas Obama não teve coragem e força de aplicá-las em Guantánamo...

Nelson Rodrigues de Souza

Um comentário:

  1. Com relação às dificuldades que Barack Obama vai enfrentar é muito interessante o texto que segue adiante de Marcos Santayana para o JB de 25 de janeiro de 2009.
    Nelson

    Coisas da Política - CIA: o maior desafio do presidente Obama

    Mauro Santayana


    Associar o medo ao poder já se tornou lugar comum na História. Avaliar o potencial inimigo e suas intenções é dever dos estados. A CIA, de acordo com a exaustiva pesquisa do jornalista Tim Weiner (Legado de cinzas, Record, 2008) tem sido, desde sua criação, em 1947, sucessiva coleção de desastres. Em nenhum momento, ela foi capaz de cumprir o seu papel de informar devidamente o chefe de Estado. Para que se justificassem, os diretores da CIA diziam ao presidente o que supunham que ele quisesse ouvir. Essa deformação se exercia de alto a baixo, chegando até os chefes de posto. A agência não transmitia a realidade, e, sim, a ficção conveniente na ocasião. Tiveram êxito, sim, nas operações de suborno político, para a desestabilização de regimes democráticos, e nas operações de sabotagem e assassinato, sobretudo no Terceiro Mundo.

    Segundo Weiner – que se encarregou de cobrir a CIA, durante muitos anos, para o New York Times – os EUA eram jejunos no assunto até a Segunda Guerra Mundial, quando criaram seu Office of Strategic Services. O OSS atuou durante o conflito associado aos serviços de espionagem britânicos, até que Truman decidiu criar a agência. Ela, como quase toda a estratégia anticomunista dos Estados Unidos, fora sugerida por George Kennan, conselheiro político da Embaixada dos Estados Unidos em Moscou, que denunciou o "plano dos soviéticos de dominarem o mundo". Sua teoria, exposta sob o pseudônimo de X, em artigo publicado pela revista Foreign Affairs, em julho de 1947, transformou-se na famosa Doutrina Truman, de contenção do comunismo pela força.

    Desde o início, a agência se dividiu em dois setores rivais: o das "operações" e o de coleta de informações por intermédio de espiões, que fracassaram no interior do sistema socialista, embora tenham tido êxito nos países do Terceiro Mundo. Quase todos seus agentes foram liquidados, ou se transformaram em agentes duplos. Durante anos inteiros, a informação que chegava à CIA era produzida pelos serviços adversários. A KGB, os serviços chineses e os da Alemanha Oriental, depois de liquidar, prender ou cooptar os espiões e sabotadores, enviavam informes fabricados a seus contatos da CIA. Um grupo inteiro de guerrilheiros anticomunistas poloneses, recrutados na Europa e infiltrados em seu país, depois de liquidado, continuou a existir e a receber fundos americanos. Um milhão de dólares, que valiam dezenas de vezes mais naquele tempo, enviados para o grupo, foram recebidos pelos serviços poloneses, que os usaram na contra-espionagem.

    São dezenas de exemplos como esses, os relatados por Weiner. Entre os êxitos operacionais da CIA, que podem ser vistos como desastrosos para a credibilidade política e o respeito interno e externo dos Estados Unidos, se encontram a derrubada de Mossadegh, que havia nacionalizado o petróleo no Irã em 1953; a destituição do presidente nacionalista Jacob Arbenz, da Guatemala, em 1954; os assassinatos de Trujillo, da República Dominicana, ditador aliado, que se tornara incômodo, e do grande homem de Estado do Congo, Patrice Lumumba, ambos em 1961, e os sucessivos golpes no Brasil, na Argentina e no Chile, com a morte de Allende e a ascensão de Pinochet. Apesar de seus métodos sujos, que empregavam de bactérias ao tiro limpo, a CIA não conseguiu êxito no que se refere a Cuba. No mesmo ano de 1961, o mafioso Tony Varona entregou a um sorveteiro de Havana veneno que seria colocado na casquinha de que Fidel se serviria. Os serviços cubanos encontraram, depois, o tubo de veneno no congelador da sorveteria. O estrondoso fiasco da invasão da Baía dos Porcos, em Cuba, também em 1961, demonstrou a incompetência da CIA: ela planejara o ataque sobre um mapa de 1895. E há o mais clamoroso caso: o de El Salvador, já nos anos 80, quando, sob o patrocínio da agência, o bispo dom Oscar Romero foi assassinado quando celebrava missa. E, além do Irangate na Nicarágua, inúmeros outros episódios. E não se fale no Vietnã.

    Jovens brilhantes e patriotas, recrutados nas melhores universidades norte-americanas, foram conduzidos ao sacrifício pela agência. Dois deles, detidos pelos serviços de Mao, passaram 20 anos nas prisões chinesas. Outros não tiveram essa sorte. O maior desafio a Obama é a CIA. Ele sabe que nela não pode confiar, mas que é necessário controlá-la. Golbery disse que criara um monstro, ao se referir ao SNI. Mas o SNI era uma quimera unicefálica, controlada pelo general de plantão. O serviço americano é uma hidra.

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