sábado, 14 de março de 2009

Um Quinteto Homoerótico- Poemas de Amor e Restos Humanos




Fugitivo de Mim

Por tanto desamor,
Por tanta repressão,
A vida me fez assim,
Doce ou mordaz,
Afável ou capataz,
Eu, fugitivo de mim...

Preso a falsas questões,
Entregue a paixões,
Que querem que cheguem ao fim.
Vou me encontrar,
Longe do meu penar,
Eu, fugitivo de mim.

Muito a temer
Se não vencer preconceitos.
Tudo a ganhar
Por exemplo: um bom companheiro.
Abrir o peito a fórceps cheio de ansiedades,
Escapar das arapucas das maldades.

Longe se vai sofrendo demais,
Mas aonde se chega enfim?
Vou descobrir o que me faz fugir,
Eu, fugitivo de mim...

(com agradecimentos a Sérgio Magrão e Luis Carlos Sá)


Você Meu Estojo, Meu Poema

João Cabral,
Faca-só lâmina genial,
Engenheiro encantado da poética,
Ensinou-nos que um poema é como um estojo,
Quando fecha faz clic...
E eu meu amor, que chique!
Quando lhe vi, em mim fez um clic!
E soube ali naquela hora,
Naquele lugar que a muitos provoca nojo,
Espaço que muitos consideram sem ética,
Numa tênue escuridão, mas com razoável esquema,
Um local com leis inefáveis, não escritas,
Mas subentendidas, sugeridas,
Cheio de estratagemas,
Provocando às vezes equívocos, feridas,
Num redemoinho de carícias malditas,
Eu soube, repito, naquela hora,
Que você é meu poema,
E lhe disse: vamos embora!
Em busca de certa privacidade,
Naquele vapor barato da cidade.
“Você tem muito mais que meia hora,
Pra mudar a minha vida..”

Havia solucionado um teorema,
Que há muito me alucinava,
Como um sentimento quase que suicida,
E enfim ali acabava,
Uma busca que achava não ter mais fim,
Pois encontrei você, perseguidor de mim!
E nos amamos muito ali enfim,
Como há muito não acontecia.
Conheci seus dons e magias,
E saímos dali, inebriados,
Tontos, felizes, enamorados,
Para viver a merecida claridade dos dias,
Com assombros, pânicos eventuais, alegrias
E nas noites podendo tocar você, mesmo no escuro total,
Sabendo ao seu lado, meu estojo, meu poema,
Agora com certeza inequívoca, fundamental,
De onde emana um irresistível aroma de alfazema.

Aos Nossos Filhos que Não Teremos

Perdoem a falta de tato,
Perdoem os poluidores inveterados,
Perdoem os rebeldes sem causa em profusão,
Perdoem os que fogem de contatos,
Perdoem os corruptos amaldiçoados,
Perdoem os burgueses enrustidos,
Perdoem nossa falta de ação,
Perdoem os homofóbicos tarados,
Perdoem a má qualidade do ar,
Perdoem os infernais congestionamentos,
Perdoem nossos jovens perdidos,
Perdoem nossos incessantes lamentos,
Perdoem as camadas de ozônio a rachar....

Os dias são...estão assim!
Espero que não estejam assim para vocês,
Espero que algo transcendente aconteça,
Que todo esse mal desapareça...

Mas pelo menos um legado terão:
O brilho do nosso sexo de irmãos
Que os banhará...
E quando tiverem mais calma,
E sossegarem a alma,
Rezem, orem por nós
Que estamos aqui,
Nós que não os geraremos,
Com espermatozóides ávidos de óvulos,
Propriamente,
(um capricho da natureza que não comungamos)
Mas que estamos com as mentes sempre em vocês,
Futuro de nossos corações,
Que é o que nos salva por hora,
Num “tudo que é sempre agora”

Não fiquem impassíveis, aturdidos, calados,
Gritem até se quiserem,
Dirijam a nós, todos os impropérios,
Desprezem nossos sonhos falhados,
De paz por todos os hemisférios,
Mas nos perdoem....

(com agradecimentos a Ivan Lins e Victor Martins)


Onde Está Você?

Onde está você?
Em saunas, bares, boates, ruas, metrôs, ônibus,
Centros culturais, teatros, cinemas, corredores e banheiros de shopping,
Madrugadas de lugares ermos ( como o Aterro, o Arpoador),
Salas de bate-papo na Internet, etc...?

Onde está você?
Onde se esconde?
Quando vai me encontrar?
Que longo caminho tenho que percorrer para chegar até você, e você a mim?
Está parado?
Está na mesma busca?
Já tem alguém?
Está contente?
Quer uma nova experiência?
Vai me deixar voltando só à noite, cantando “Ronda”?
( “De noite eu rondo a cidade a te procurar...”)
Vai me deixar cantando “A Noite”?
( “A noite tem deixado seus rancores gravados...”)
Onde está você?
Gosta de mulheres também?
Tem mulher? Tem filhos?
Tem um namorado? Tem amante? Está sozinho?
Será que você vai mudar a minha vida?
Juro que quando lhe encontrar não vai saber das feridas
Que trago de outros amores,
Estarei pronto para você.
“Pode entrar que a casa é sua”
Ou vai me deixar aqui cantando “Eu e a Brisa”?
(“Quem sabe o inesperado faça uma surpresa...”)
Vai me deixar apenas mastigar os alimentos,
Os filmes, as peças, os livros, os CDs, os DVDs...
Apenas ouvindo falar de amores, aventuras,
Prisioneiro de certa pequenez,
Eu aqui pelas noites escuras,
Os dias preenchidos de silêncios e dores sublimadas...
Onde está você?
Por que adora se esconder?
Por que esta voz tão calada?
Por que não quer me conhecer?
A solidão também lhe dói?
Corrói? Destrói?
Ou é daqueles que construíram um mundo só para si,
Sem espaço para mais ninguém,
Sem nunca querer dizer nem “Meu bem”?
Já sei, você passa o tempo vendo tevê...
Eu não!!!
(“Eu não sou audiência para a solidão”)
Onde está você?
Não vê que estou envergonhado segurando as lágrimas?
Não vê que me desespero às vezes?
Não vê que fico assanhado, deixo de lado o recato
E admito em alto e bom som, que não estou feliz sem você?
Será que vou ter de sair por aí gritando, berrando, pra você me ouvir?
(“É impossível ser feliz sozinho..”)
Será que vou ter que me expor em classificados de namoros e encontros,
No manhunt, ursos.com.br, jornais e revistas e que tais?
Não vê que eu já esperei muito?
Não percebe que estou por um triz
Não sente que não agüento mais?
E esta carne que é meu invólucro, é tão perecível?
É o tempo passando ( “me comendo feito traça”).
E você aí de pirraça,
Bebendo não sei o que...
Vinho, cerveja, drinques,
Pra ter forças de não se encontrar comigo.
Você que eu não conheço,
Mas sei que existe.
Será que não sabe como é tão triste,
Não ter a certeza de que você vem?
De trem
De avião
De caminhão
Ou outro meio...Invente!
Mas venha!
Meus tranqüilizantes
Já não são mais simpatizantes,
Dos meus receios, das minhas angústias, dos meus anseios.
Será que “dependo da bondade de estranhos”?
Será que não vou perder a paciência com você
E ficar aqui igual, parado?
Desculpe-me, você pode estar como eu, me procurando,
Mas Deus, o destino, a sina, seja lá o que for,
Não quer que nos encontremos.
Está nos sabotando!
Nos castigando!
Por quê?
O que fizemos?
( “Oh Deus será que o Senhor não está vendo isto?”)
Não sei...
Só sei que lhe amo amor...
Espero que me ame também...
Mas ainda não nos conhecemos,
Só sabemos o que queremos.
Eu eu aqui na saudade
De algo que ainda nem aconteceu,
Mas que de modo algum em mim morreu.
Esta vontade louca de encontrar você.
Saber de você.
Como você é.
Se é como imagino, como sonho.
Ah! Eu sei:
“A realidade é sempre mais ou menos do que nos queremos”
Não posso ter um ideal a encontrar,
Quero você bem real,
Tomando posse de mim,
Seqüestrando meu coração,
Mas me doando o seu.
Amor, há muito humor e ironia aqui
Mas saiba que eu também sou um fingidor,
Sofro mais do que suscito,
No fundo calo dentro de mim,
Um profundo grito,
Como o de Munch
E não há nada que o dissolva,
A não ser você.
Onde está você?
Em outro planeta e ainda vai cair na Terra?
Tem olhos de gato?
De tigre?
Onde está você?
Quando nos veremos?
Vai esperar outras encarnações?
Mas se você voltar mulher,
E eu como eu sou...
Não vou gostar do que você vai querer...
E se os místicos todos estiverem equivocados,
E não há nada além do outro lado da porta?
Como estaremos apaixonados no vácuo,
No limbo impalpável da morte?
Assim venha logo amor,
Não me faça mais perguntar “Onde está você?”
Estamos perdendo tempos preciosos.
“O tempo é um carrasco sombrio”,
Afinal, pela última vez?
Terei coragem?
Onde está você?


Poema Para o Pai

Pai,
Sabes que
Psicanaliticamente,
Sociologicamente,
Politicamente,
Antropologicamente,
Compreendo tudo o que fizeste
De Mal para mim.

Falemos só do Mal agora.
Abstraiamo-nos do Bem que também me fizeste.
Eu sei que sei pai/meu avô
Te jogou no mundo sem nada
A não ser com uma ferramenta,
Pra mim uma piada de mau gosto,
Que arde como pimenta...na alma....

Meu avô foi o pivô de tudo!
Mas devo me lembrar do bisavô, do tataravô
De todos os ancestrais?
Todos patriarcais.

Pai, eu o perdôo, perdôo, perdôo....
Mas há no fundo de mim
Uma mágoa
Quem nem toda água
Do mundo pode lavar!

Não quiseste entender o meu amor,
Por ti, por outros homens.
Saiba agora, beijei tantos
Tantos encantos
E nunca compartilhei contigo.

Agora divido minha felicidade com ti,
Esteja onde estiveres
Como um vulto feliz que toma a forma que quiser,
Abraços, beijos, carinhos de quem bem te quer.

A mágoa?
Meu amor aqui, muitas vezes apaga!
Essa chaga, essa chaga.

Mas pensemos agora no Bem,
Na honestidade íntegra
Que me doaste.
"Não há um prego nesta casa
que não seja meu”
E era verdade das mais verdadeiras
E isto é legado para uma vida inteira.

& &&&&

Amor, vamos às nossas deliciosas brincadeiras
Em louvor ao meu querido pai.
E chega pra mim de ái, ái meu Deus!
Chega de lamentações!
Só outros áis
Você é demais...
Juntemos nossos corações
Ao do meu saudoso pai
Não há o que lamentar mais
Mas ficam ainda estas últimas rogações,
Para dar um fim a este mental e espiritual bangue-bangue!
“Pai perdoai-me por não ter sido tolerante com a sua intolerância.
Pai afastai de mim esta mágoa, um descaminho do seu próprio sangue”

In Memorium de Geraldo Carlos de Souza

Nelson Rodrigues de Souza

Um comentário:

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