segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Meu Lugar sobre “No Meu Lugar” de Eduardo Valente- Uma Primeira Impressão







Meu Lugar sobre “No Meu Lugar” de Eduardo Valente- Uma Primeira Impressão

Por que uma primeira impressão?

1- Porque vi o filme no Cinema do Centro Cultural dos Correios (Mostra “15 anos do Festival Brasileiro de Cinema Universitário”- Ex-alunos), que é uma tela improvisada ao fundo do palco. A imagem estava boa, mas o som baixo, ainda que audível pra mim que sentei na terceira fila. Um som talvez um tanto perdido pelos vazamentos que tem a sala, utilizada geralmente para espetáculos teatrais, onde os atores procuram colocar suas vozes a uma altura que até o espectador da última fila escute bem.

2- Porque o Cinema/Teatro me tinha e por alto mais umas seis pessoas apenas. Gosto muito de ver cinema solitariamente na minha TV de Plasma em casa. No Cinema não. Gosto da comunhão que se estabelece entre público e tela, mesmo com as barulhentas pipocas. Fellini costumava dizer, com toda razão, que ver um filme no Cinema é como participar de uma missa, um ritual onde há toda uma comunhão que faz a sua grande diferença. A televisão não passaria para ele de um eletrodoméstico (não é à toa que fez “Ginger e Fred”, um filme definitivo sobre a alienação que a TV, de modo geral traz, onde o momento de epifania se dá quando a luz acaba...). Da forma que foi realizada a projeção, eu me senti triste e um tanto melancólico, o que prejudicou a fruição do filme.

Assim meus comentários a seguir são passíveis de mudança após uma revisão que procurarei fazer quando o filme for lançado em DVD.

“No Meu Lugar”( Brasil/2009) me soou com uma obra apenas regular. Há um excesso de cálculo no seu roteiro e realização de forma a deixar o filme frio. As elipses que o filme adota para esconder as cenas de violência são bonitas, mas as três histórias narradas em paralelo (policial intervém em um assalto numa casa de classe média e provoca uma morte que o fará ser afastado e ter de responder pelo caso; entregador de supermercado apaixona-se por uma empregada; uma mulher volta anos depois à casa que quer vender com seu novo marido, sendo que o anterior morreu na intervenção desastrada do policial) não tem muita força ainda que consistentes e razoavelmente interpretadas. O elenco rende bem de uma forma uniforme. A meu ver, sem destaques.

O filme é bastante interessante pelo que não mostra e nos incita à imaginação, mas o que mostra, até que o roteiro atinja uma circularidade, é uma rotina que nem sempre tem seu encanto... A montagem paralela de histórias foge do que estamos acostumados a ver, por exemplo, nos roteiros filmados de Guillermo Arriaga. Ao contrário de certa parcela da crítica (Valente incluído) gosto muito do que Alejandro González Iñárritu fez destes roteiros arriagarianos em “Amores Brutos, “21 Gramas” e “Babel”. São filmes diabólicos, viscerais, feitos mexendo fundo nas entranhas de seus personagens provocando um choque na platéia que pra mim é muito bem vindo e salutar, pois acredito que vivemos num mundo onde as pessoas estão anestesiadas na contemplação/reflexão da miséria em todos os seus matizes que nos ronda cotidianamente, até mesmo a miséria espiritual (e aqui não há nada de nostalgia de um cristianismo verdadeiro perdido, pois não sou cristão).

O melhor trabalho de Arriaga e que deu origem ao melhor filme baseado em roteiro seu, no entanto, é o sensacional “Três Enterros” de Tommy Lee Jones que teria sido fruído melhor se o título original “As Três Mortes de Melquiades Estrada” tivesse sido obedecido.

O trabalho também com filmes corais (histórias paralelas, tempos diversos, vários personagens) de Paul Thomas Anderson em filmes com “Boogie Nights” e “Magnólia” é esplêndido, principalmente este último, que nos reserva uma apocalíptica chuva de sapos que é antológica. Há amor, vilania, misoginia, morte, desamor e redenção, sendo que esta última, principalmente, incomoda muita gente. Mas o processo de redenção dos personagens é construído com sólida dramaturgia e desempenhos, de modo geral, magníficos, com o provável melhor trabalho de Tom Cruise até hoje.

Eduardo Valente foge em “No Meu Lugar” de todos estes filmes, como o diabo foge da cruz. Há inegavelmente originalidade na estrutura de seu filme ao aventurar-se por um neo-filme coral. Os enquadramentos são inegavelmente belos. Mas tudo é tão minimalista, contido, cotidiano demais e esta também é uma arte muito difícil que requer um Yasujiro Ozu para que funcione à perfeição. O roteirista Felipe Bragança atingiu resultado muitíssimo superior ao captar flagrantes de emoções em “O Céu de Suely”, uma das obras primas do grande Karin Aïnouz que junto agora com Marcelo Gomes ( “Cinema, Aspiras e Urubus”) nos lega a também obra-prima “Viajo Porque Preciso, Volto Porque te Amo”, que se transformou num filme de culto, estando há várias semanas em cartaz no Arteplex-Rio de Janeiro, num único mas louvável e heróico horário diariamente.

O filme de Valente soa um tanto anti-séptico. O filme aspira a ser algo que os filmes corais não foram e também a ser algo bem distinto do cinema brasileiro recente que tem explicitado a violência urbana, o estado de guerra civil não declarada (ou declarada?) em que vivemos hoje no Rio de Janeiro e em São Paulo. Assim paradoxalmente, um tanto afogado em excesso de elipses, “No Meu Lugar” é um filme de grandes ambições, que nos obriga a “farejar” o que ocorre na tela com uma grande acuidade para podermos dar conta delas, mas na prática o que acabei vendo foi um filme que beira a despretensão, atingindo certo grau de anemia cinematográfica.

No Festival de Paulínia de 2009 o júri oficial preferiu premiar “Olhos Azuis” de José Joffily em detrimento de “No Meu Lugar”, entre outros. Ao meu ver, ressaltando que é um primeira impressão, neste embate dos dois, o júri acertou pois “Olhos Azuis” tem uma parte que se passa na “recepção” aos estrangeiros suspeitos num aeroporto dos EUA que é hipnótica, verdadeira e contundente, com trabalho extraordinário de Irandhir Santos como um brasileiro que já mora nos EUA e tem sua entrada barrada, sendo submetido a um sórdido policiamento que provoca-lhe um progressivo enlouquecimento. Já na vinda do americano-inspetor-aposentado-doente ao Brasil há certa queda de ritmo. No conjunto um bom filme.

“No Meu Lugar” é produzido em parte pela Vídeo Filmes que conta como um dos sócios Waltinho Salles ( pra mim o melhor cineasta brasileiro vivo hoje, junto com Walter Lima Júnior, Nelson Pereira, Coutinho, Karim e Marcelo) e isto me faz lembrar de uma história que tem sua graça:

Diante de “A Grande Arte” primeiro filme de ficção de Walter já profissionalíssimo, um filme que tem seus grandes momentos como um travelling extraordinário que vem do relógio da Central do Brasil até o quarto de um hotel barato na Lapa, onde vemos uma prostituta morta (se não me engano), mas que no conjunto é um corpo muito estranho no Cinema Brasileiro e o próprio Walter reconhece que a partir do essencial, dentre outros, “Terra Estrangeira” é que acabou encontrando seu tom, sua marca autoral que nos traz tanta beleza até hoje.....Enfim, diante de “A Grande Arte” Neville D`Almeida apelou para um atalho crítico vergonhoso e falso. Não tinha nenhuma obrigação de ter gostado da obra, mas dizer que é um filme feito por um filho de banqueiro e que só poderia dar nisto, é algo inconseqüente e irresponsável. Walter reagiu de uma forma curta, fina e genial: Neville é um elefante que usa pantufas!

Mas convêm aqui uns reparos. “A Dama do Lotação” de Neville é baseado em uma pequena história de Nelson Rodrigues que foi esticada para virar filme, o que o prejudica. Já “Os Sete Gatinhos” (ainda que longe dos resultados rodrigueanos maravilhosos atingidos por Arnaldo Jabor em “Toda Nudez Será Castigada” e “O Casamento”), no entanto, é um filme forte, um autêntico ácido jogado no conservadorismo e hipocrisia da sociedade brasileira. É um filme do qual gosto e que gostaria até de rever. “Os Sete Gatinhos” é uma obra em tudo e por tudo diametralmente oposta a “No Meu Lugar”. Aonde em Neville existe uma “grossura” fortemente crítica, em Valente há pura elegância. Mas elegância não é tudo em cinema.

De Eduardo Valente com sua vasta cultura cinematográfica e grande capacidade de escrita crítica neste sentido, eu esperava muito mais do que vi. Valente não tem nada de elefante. Fez seu filme como um artista cosmopolita, dono de invejável erudição cinéfila, mas para terminarmos com uma metáfora, fez seu filme usando pantufas. De tanto querer evitar clichês, o que consegue, temos de admitir, caiu num filme um tanto anódino. Torço para que em seu próximo filme se aproxime mais da idéia de um “poema sujo” cinematográfico, enfim “que tire as pantufas”, caminhe com os pés descalços no chão e atinja com mais vigor a carnadura do real, o que um Cláudio Assis de “Amarelo Manga”, “O Baixio das Bestas” ( e provavelmente no em preparação “Febre do Rato”) atinge de sobra.

Para finalizar mesmo é bom ressaltar ainda mais que se trata de um primeiro contacto com um filme, uma primeira impressão, obra vista em condições que não foram as melhores, as mais adequadas. Sem falsa modéstia, eu afirmo que a minha modéstia aqui ao admitir estas limitações deveriam ser mais seguidas pelos críticos de cinema de jornais, de sites e blogs onde só encontramos uma primeira impressão sem este alerta. Uma exceção que me ocorre é Luiz Carlos Merten do Estadão que está sempre comentando em seu blog as impressões que teve em revisões. No Teatro as impressões de uma noite de estréia de uma peça transformadas em críticas definitivas têm sido um desastre de que não estão isentos nem o elegante Macksen Luís nem, principalmente, a famigerada shakeaspereana Bárbara Heliodora, muitas vezes arrasadora (‘Isto não é Teatro”; “A montagem é um equívoco total”; “Moacyr Góes em Pinóquio transforma André Valle num ator de teatro infantil de quinta categoria“, dentre outras pérolas). Mas esta questão do Teatro é um assunto que rende outro post.

Ps1 Aonde estavam os estudantes universitários de cinema ou não, que não foram prestigiar num domingo a sessão de “No Meu Lugar” no Cinema dos Correios? Será que todos já viram o filme? Não acredito nisto. Acredito mais em falta de interesse mesmo.

Ps2 Sobre “Pindorama” de Arnaldo Jabor o crítico Orlando Lopes Fassoni escreveu na Folha de São Paulo: “Se alegoria matasse ninguém sairia vivo do cinema”. Já com relação a “No Meu Lugar” somos tentados a dizer “Se elipse matasse, ninguém sairia vivo do cinema

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Nelson Rodrigues de Souza

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