terça-feira, 7 de abril de 2009

"Macunaíma Acorrentado" e Outros Poemas



O grande escândalo sou eu aqui só

Caetano Veloso

A perfeição é inimiga da realização

Nelson Rodrigues de Souza

Revolta

Nem mesmo orgias em cemitérios,

Nem mesmo gargalhadas em velórios,

Nem mesmo roubar doces das crianças,

Nem mesmo sórdidas e covardes vinganças,

Nem mesmo desafiar a paciência dos generosos,

Nem mesmo a arrogância dos poderosos.

Nada é mais tido como maldito

Do que o nosso amor.

Mas o que fazer?

Sofrer?

Jamais!

E sim

Amar você amor, sem fim,

Trocando o dito pelo não dito,

Mandando praquele lugar

Todos aqueles que ousam

Impedir que eu continue a lhe amar.

Renascimento

Amor,

Ressuscita-me

Pra que a partir de hoje...

A partir de hoje...

As famílias se transformem,

E os pais sejam pelo menos pouco perversos

E as mães sejam no mínimo mais ternas

E nós possamos viver

Totalmente submersos,

Nossa união fraterna

Nosso estranho amor,

Nossos desejos mais recônditos,

Nossos anseios mais legítimos,

Rechaçando a pecha de malditos,

Não desprezando nossos pactos íntimos,

Vivendo feliz apesar dos equivocados,

Com seus preconceitos extremados,

Que querem regular nossas pulsões,

Nossos ritmos, nossos sonhos, nossos corações!

(com agradecimentos a Maiakóvski, Caetano Veloso e Ney Costa Santos)

Caravana

Nem todos os orixás reunidos e seus sortilégios,

Nem todos os deuses do Olimpo e suas façanhas,

Nem todos os líderes religiosos unidos em prece,

Nem todos os presidentes, seus assessores e meganhas,

Calarão esse amor que sinto por ti.

Nem todos os escândalos que pipocam aqui e ali,

Nem todas as tragédias que acontecem no planeta,

Nem todos os especialistas da alma&corpo&mente,

Nem todos os horrores mundiais e suas várias facetas,

Calarão esse amor que sinto por ti.

Nem todas as trapaças de corruptos políticos,

Nem todos os temores inclementes,

Advindos de desígnios desconhecidos

De oráculos apocalípticos,

Nem toda loucura de seres dementes,

Nem todas as dores dos desvalidos de sempre,

Calarão esse amor que sinto por ti.

Nem mesmo tu, meu amor,

Se tu me deixares (Oh! Meu Deus!)

Calará esse amor que sinto por ti.

Ficarei aqui embasbacado com teu adeus,

Mas meu amor por ti

Eu gritarei por toda parte,

Mais fortemente do que podem os badalos de todas as igrejas,

Aturdindo até o silêncio de Deus,

E tu hás de ouvir onde quer que estejas,

Como todos ouvirão,

Até que tu voltes pra mim,

Minha oitava maravilha do mundo,

Minha obra-de-arte,

Meu desejo inextirpável mais profundo.

Mas venhas, esqueças todo esse palavrório.

Sintas logo nossa grande arte,

Uma eterna obra-prima.

Tu embaixo, eu em cima,

Tu em cima, eu embaixo,

Neste profano oratório

E em sua alma eu como que me encaixo,

De uma forma que alucina.

E todos os cães deste mundo podem ladrar

Que nossa caravana vai passar,

Carregadinha de um amor,

Que compactua com o Absoluto

Que não é maldito, é sagrado,

Ainda que seja puto, bem puto.

( agradecimentos a João Silvério Trevisan)

Meu Menino Vadio

Meu Pixote

Mame os meus peitinhos,

Que eles são todos seus.

Meu filhote, não me boicote,

Que eu vou lhe cobrir de carinhos.

Pra rua é que você não vai mais não.

Quero me agarrar aos pêlos teus.

Fica comigo todos os dias e noites,

Meu amante, amigo, irmão

Me açoite, me açoite

Com seu pau enrijecido

E depois com nossos corpos adormecidos,

Sonharemos com nossos bons eflúvios.

Você meu Pixote

Com todos os seus meneios e toques,

Me salva de tudo,

Até mesmo dos dilúvios

Que nos ameaçam até o pescoço.

Meu menino peludo,

Fico aqui roendo sua carne, seus ossos,

Roçando sua linda alma,

Com calma, com calma,

Pra nunca acabar

Essa sensação maravilhosa,

De ter encontrado

Afinal, uma criatura tão gostosa,

Um grande namorado,

Para amar, trepar, gozar.


Pixote fique! Nada de rua!

Nada de peregrinar no vazio.

Nada de vida amarga e crua,

Obedeçamos ao nosso doce cio,

Pixote fique! Não fuja!

Pra que se confinar a uma vida suja?

Fique, nada de se perder por entre trens

Vagar, vagar, como alma penada, sem nenhum vintém.

Pixote fique! Fique!

Meu menino vadio,

Maltratado, maltrapilho

Mas segundo meus olhos, bem chique.

Sofro com meus augúrios

De que você prefira uma vida bandida,

Com os perigos dessa gente tão enlouquecida,

Com roubos, achaques

E não adianta dizer que você é um dos craques

Deste covil onde não há porvir.

Eu posso lhe dar uma boa e preservada identidade.

Você comigo viverá, breve, seus vinte anos

Aproveite que não é mais flor em botão

Que tanto alegria traz ao meu coração.

Nada de desatinos, correrias e atos insanos,

Nada de um destino como o menino de Babenco.

Você já é um adulto tão bonitão.

Não faça parte desse perigoso elenco.

Meu filhote, meu alento, meu filho

Com você eu cada vez mais brilho.

Vem, vem, para nossos beijinhos

Sossega meu leãozinho,

Que meu leitinho

Agora é mais prazeroso.

Chega de marcas roxas,

Esqueça lá fora,

Viva o aqui que pode ser sempre agora!

Chega amor de enganar trouxas.

Deixa esse lamaçal perigoso,

Meu gato querido e gostoso.

Pixote, eu te imploro

Não vê como eu choro e choro,

Com tremendas infelicidades,

Angústias e loucuras,

Advindas do medo de lhe perder,

Para esse mundo onde você foi crescer,

Comendo o pão que o diabo amassou

E lhe entregavam,

Provocando no estômago gasturas.

Pixote, não dê as costas a tudo que de nós ficou.

Meu menino, chega de rodopiar

Do nada para lugar nenhum

“Como o diabo na rua, no meio do redemoinho”

Não, não fique nunca mais depauperado e sozinho.

Vida de michê achacador corta como faca, \

Mas vamos acabar

Com este acutilador pensar.

Meu Pixote, dê adeus definitivo a essa cloaca

Ao vampiro do desamor finquemos uma estaca,

Pois eu sei que já estou lhe amando e vou continuar,

Por todos os meios

A beber de sua fonte incomum,

Todos os odores, todos os devaneios,

Exorcizando toda coisa ruim.

Vivamos todos nossos doces pecadilhos

Esqueça esses trens, meu grande bem

Me ouça, vem , vem, vem meu neném

Meus braços são seus trilhos.

(com agradecimentos a Hector Babenco, Marília Pêra e Francisco Ramos da Silva)

Meu Amor Siamês

Meu amor siamês,

Coisa mais linda que Deus fez.

Você com sua pose de pensador

De Rodin.

Você com seu jeito Zen.

Você meu talismã,

Com sua alma serena,

Que não é nada pequena.

Você meu neném,

Que sobe ao meu colo,

Encaixa-se onde puder.

O ser que eu consolo

E me diz que me quer

Muito...muito.....

Com sua linguagem particular.

Como eu lhe quero,

Você que espero

Jamais fuja de mim,

Pois para mim

Seria o fim sem meu gatinho.

Não consigo jamais

Ficar bem, sozinho

Sem a sua companhia

Perdendo sua Zen sabedoria.

Meu amor siamês,

Eu sou é freguês,

Constante e viciado

Nos carinhos e pelinhos teus.

Meu amor, meu namorado,

Meu siamês taradinho,

Meus cais, meu carinho,

Te amo muito.....

Não me diga nunca adeus.

Meu Amor Aquário

Você sabe querido,

Que mergulhei em águas profundas

Nas quais você me arrastou,

Mas como você me encantou

Demais...demais..demais....

Não me preocupei,

Nunca achei que estivesse me metido

Numa barafunda!

Pelo contrário,

Agora tenho paz!

Amor querido

Com você, nadamos, nadamos,

Amamos, amamos,

Vivemos nosso amor ousado

(Dizem as más línguas:

Coisa de viados ).

Mas amor, meu aquário,

Com você não há tubarões atacando,

Nem polvos, nem arraias.

Com você só há lindos peixinhos.

Então amor, devagar, de mansinho

Meu amor aquário,

Quero ser eternamente solidário

A você,

Ao nosso amor,

Meu aquário querido,

Meu itinerário,

Meu diário amadurecido,

Águas em que navego sem medo,

Espantando o desassossego,

Sentindo uma paz grandiosa,

Gloriosa,

Misteriosa.

Aquática,

Errática,

Mas doce, muito doce.

Meu Amor, Minha Religião

Amor, você é minha religião.

Leio um pouco sobre todas elas,

Ou quase todas,

Digamos muitas,

Mas nenhuma me apetece

Nenhuma me faz ter um clic:

É essa! É essa! É essa!

Amor o que fazer?

Para onde ir?

Freqüentar Igrejas católicas?

Templos evangélicos?

Terreiros de Umbanda?

Terreiros de Candomblé?

Terreiros de Umbanda Branca?

Terreiros de Quimbanda?

Terreiros de Itaparica

Que cultuam eguns?

Maçonarias ocultistas?

Seguidores de Ramatis?

Encontros com Homens Notáveis

A la Gurdjieff?

Centros Espíritas voltados para a teoria?

Centros Espíritas voltados para a prática?

Ou as duas coisas?

Templos budistas?

Mesquitas muçulmanas?

Cabalísticas sinagogas?

O pessoal do Santo Daime?

Testemunhas de Jeová?

Templos Xintoístas?

E outros que agora não me ocorrem....

Templos...templos..templos...?

Terreiros...terreiros...terreiros...?

Casas...casas...casas.....?

Florestas...florestas..florestas....?

Matas...matas.....matas....?

Cachoeiras...cachoeiras..cachoeiras...?

O que fazer amor?

Para onde ir?

Já nem mais sei rezar,

Por tantos desenganos & desencantos.

Como elevar a Deus minha prece, meu canto?

Será que sou digno de falar com Deus

Sem intermediários?

Não sei! Não sei!Não sei!

Mas de algo eu sei!

Você no fundo, com seu sêmen sagrado

(Tudo que é criação de Deus é sagrado....)

Que jorra doce sobre os cabelos do meu peito

É minha religião particularíssima

Em seus braços me entrego com devoção,

Com fervor amoroso,

Com o coração exposto

Sangrando como o de Cristo!

Por isso amor, eu e você e nosso amor,

Somos outra santíssima trindade

(ainda que alguns a adjetivem de maldita).

Trindade amor, que singularíssima

É como se fosse,

Nossa virgem santíssima

Que adoramos,

Por mais que saibamos

Que de santos não temos nada

Então meu amor,

Minha religião,

Deixe-me ajoelhar na cama

E beijar teus pés de corpo nu

Como o meu!

Benção amor, que Deus nos proteja

A nosso imenso, intenso amor

Pois afinal não dizem eles,

(aqueles que não provam

o gosto da cereja,

por medo, por culpa, sei lá

e não querem que ninguém

ninguém...ninguém..ninguém....o faça!)

Que Deus é Amor,

Pois então você é meu Deus, minha religião!

Salvamos o nosso mundo com nosso amor!

Nelson Rodrigues de Souza

Instalação Viva

Olho sutilmente ao lado, embaixo,

E você de pau duro.

A urina já desceu há algum tempo.

Você se acha seguro,

Mas eu prefiro um quarto,

Mesmo que escuro,

Para lhe tocar, acariciá-lo, pegá-lo, senti-lo,

Por uma de suas bordas mais sensíveis.

Eu não sei o que falo,

Estupefato, diante do seu falo,

Algo inebriante que me provoca medo e audácia.

Tenho receio de que a qualquer instante,

Entre alguém com bastante perspicácia,

E entenda que estou morrendo de tesão,

Por você, por sua frenética mão,

Que envolve seu pau imenso,

Algo que me deixa muito tenso,

Pois atenção!

Pessoas de fora já chegaram,

Neste banheiro gigante.

Terá entre elas uma criança?

Observará ela nossa aliança

invisível, mental, carnal?

Será que ela alcança

O sentido do que ocorre aqui?

Eu cá, você aí,

Tontinhos, com pênis eretos,

O que pode não ser correto,

Mas é irresistível...

Minha vontade é lhe tocar

E deixar você me pegar,

Mas o infante vai nos deixar,

Com tromba de elefante,

Mortos de vergonha,

Com caras de pamonhas

E o pai o que dirá?

O que acontecerá?

Será que saberão,

Que uma criança dormindo na rua,

Esta sim é uma visão dantesca,

Algo terrível, uma aparição grotesca,

Que agride a alma de qualquer ser,

Não o nosso amor, ainda por nascer, crescer,

Com esse primeiro contacto,

Que a outros pode causar impacto,

Mas é simplesmente a natureza humana,

Que jamais mente

E se revela em qualquer parte,

Mesmo num banheiro público,

Para horror dos falsos pudicos,

Pois olhariam com a mesma nossa avidez,

Uma mulher e sua vagina,

Que estivesse ao lado, em sua nudez

Quebrando suas hipócritas disciplinas.

Você que está aí, me entenda!

Não sei até onde iremos,

Mas que está gostoso está.

Será que é só isso que queremos?

Será que acaba aqui sua oferenda?

Ou algo mais vai pintar

E não ficarei ao Deus-Dará?

Quem sabe eu ainda vou lhe amar,

Com todo aparato que merecemos,

Longe deste perigo, desta migalha,

E minha angústia amainará.

Criaremos então uma fornalha

De tal forma quente,

Que até mesmo essa gentalha,

Aqui desconfiada de nossas ações,

Sem se importar com nossos corações,

Batendo, batendo,

Cheirará grossa fumaça,

Longe daqui, nas ruas,

Numa vingança nossa, feito pirraça,

Com nossas almas nuas,

Nossos corpos viris,

Colados com paus à mostra,

Juntinhos, eu agarrado à suas costas,

Numa viagem pessoal muito feliz,

Que espero que seja como você gosta,

E eu lhe enchendo de amor, simples amostra

Do que ainda podemos fazer,

Muito além deste calor que me faz suar,

Por não poder lhe amar,

Aqui neste lugar tão devassado.

Nós, devassos num lugar estranho,

Com um medo tamanho,

De sermos escorraçados daqui,

Pelos intolerantes que nos consideram viados,

Sem amor, sem vergonha,

O que é uma mentira tacanha,

Pois simplesmente o que há,

É um primeiro sinal

De amor, de afeto, de tesão, de desejo,

Prováveis ou improváveis não importa,

Acima do bem e do mal,

Que no fundo não faz mal a ninguém,

Não justifica esta coisa banal,

De falar, xingar,

Este desdém

Pelo que é diferente,

Do que essa gente sente,

Pois não somos natureza-morta.

( No fundo nem tão diferente assim...

Eles entendem sim.

Eu pra você, você pra mim,

Faz parte do humano, demasiadamente humano,

Pulsões de vida sob um poder soberano,

Que vale tanto para fulano, beltrano e cicrano)

Agora o ambiente está novamente vazio,

Não mais curiosas e inconvenientes testemunhas,

E podemos dar trela ao nosso lado vadio,

E o mundo pode nos tiranizar com as mais torpes alcunhas.

Ái amor, devagar,

Assim, com as pernas já dormentes,

Vou gozar, vou gozar.

E vejo o líquido branco fluindo também de suas entranhas,

Comprovando como podemos ser independentes,

Imersos em sublime e suis generis perspectiva.

Olha só nossa reação

A uma autêntica e imprevista exposição.

Nós que por um triz não estivemos em palpos-de-aranha,

Compusemos para este povo que aqui circula

Uma instalação viva,

Algo que ele especula,

Mas não apreende o sentido,

Obra aberta que é de um terreno incompreendido,

Mas certamente pressentido.

Afinal, quem pode atirar a primeira pedra?

Quem pode negar o desejo que medra?

Nosso Amor Quase Budista

Meu amor, Buda nos ensinou,

Que o instrumento da vida,

Não pode ter cordas muito esticadas,

Pois senão elas arrebentam.

Mas também não podem estar frouxas

Pois então as melodias soam horríveis.

Meu amor, onde?Mas onde?

Como? Como?

Como fugir desse esconde- esconde,

Encontrar equilíbrio para nosso amor,

Tão caluniado,

Tão miserabilizado

Pelos algozes,

Pelas vozes discriminatórias atrozes?

Como navegar neste mar de rancor?

Como viver nossa lida,

Neste vendaval de imobilizações,

De gente que não aprende básicas lições

E não deixam a vida dos outros em paz?

Mas meu amor quase budista,

Você com sua alma de artista,

Sereno, simples, comedido,

Afasta de mim todo Satanás,

De dentro, de fora

E eu não me sentirei vencido.

Seguirei a vida com você,

Num tênue equilíbrio,

Fazendo do vendaval,

Um manso rio,

Um carnaval,

Bem Zen, bem Zen

Exorcizando o mal,

Que anda por aí, aqui,

Quando enfrentarmos qualquer sinal,

Que nos seja fechado.

Amor, meu budista tarado,

Vem com seu tantra,

Cantaremos juntos o mantra

Do nosso amor,

Do nosso amor.

Do nosso amor.

Nosso Amor “Monstruoso”

Amor,

Nós estamos inventando a vida,

Apesar do disse-me-disse,

Que muita gente mordida,

Contaminada de idiotice,

Dedica ao nosso gozo e afeto,

Que chamam de sem-vergonhice,

Discriminando o que seria errado do correto.

Amor, eu sou Dr. Franskenstein

Mas do Bem!

Você também.

Criamos um “monstro” como dizem,

Que é nosso amor desviante,

Que quer seguir sempre adiante.

Mas e daí ?

Não vamos deixar que nos pisem,

Porque quem renega, vilipendia, calunia,

Tem inveja, vergonha, ojeriza,

Tenta proibir, barrar leis que nos sejam favoráveis,

Esses seres que desfilam sua ignorância à luz do dia,

Que acreditam que a gente vive de brisa,

Estes sim, são verdadeiros e deploráveis

Monstros!

Nosso Amor Kafkiano

O pai de Kafka, amor,

Sobre o mapa-múndi deitava,

E assim, autoritário, delimitava

Por onde ele deveria se mover,

Num ato de autêntico horror,

Contrário ao livre-arbítrio de viver

Essa gente amor,

Que atende pelo nome de “eles”,

Quer também deitar

No nosso mapa do mundo,

Para que a gente não possa se amar

E ái daqueles,

Que ousem contrariar,

Essa turba de pensamento moribundo,

Que acredita que assim vamos parar,

De ir onde queremos,

De satisfazer nossos desejos

Como se fôssemos blasfemos,

Numa vã tentativa de castrar nossos festejos.

Eles que se deitem, sordidamente, neste mapa,

Que nós, enxeridos, atravessamos sobre eles,

Amando sobre seus corpos, à socapa,

E deixando escorrer porra...muita porra,

Que ultrapassará os limites que nos estabelecem

Mesmo que a gente “morra”,

Zombando da cara deles,

De amor, de tesão, de prazer, de loucuras,

Doces delitos que não há nada que os arrefecem

Já que seus corpanzis não passam de entulhos,

A estorvar nossas benignas aventuras,

Nossa gana de viver, nosso orgulho

De sermos o que somos, apesar do que são eles.

Vejam se nos esquecem...esquecem..

Deixe-nos amar e viver em paz.

Será que é pedir demais?

De Placentas e Desassossegos

“Já aprendi matemática,

Que é a loucura do raciocínio

Mas agora quero o plasma,

Quero alimentar-me diretamente da placenta”

Por isso meu amor, me abrace,

Cedamos à nossa particular gramática,

Ao nosso gozoso tirocínio,

Aquilo que pra muitos é um fantasma

Mas pra nós a noite fria, esquenta.

E é como se o mundo todo se calasse,

Pra ouvir, sorrateiro, nossos murmúrios,

Nossos delírios, nossas falas indecentes,

Com a benção do mensageiro dos deuses: Mercúrio.

Pois então vamos nos dar mútuos presentes:

Eu quero seu falo bem ereto,

E terá boca e língua minhas lhe acariciando,

Num frenesi de movimentos repletos,

Plenos de desejo, gozo, delícias, sabor.

Você, seu corpo, sua pele, seu amor,

São algumas das placentas divinas,

Nas quais me alimento, me sacio,

E esqueço, por exemplo, a loucura das esquinas,

Onde aqueles meninos dão um salto no vazio,

Lutam desesperadamente pela sobrevivência,

Equilibrando limões nos sinais,

Mais um caso de descaso, inconseqüência,

De uma matemática fria por demais,

Enlouquecida, que tecnocratas de “coração-de-uva-passa”,

Dia a dia nos impingem,

Cobrindo-nos com uma negra cortina de fumaça,

Que nos deixa tontos, estressados,

Enquanto eles teimam, mentem, fingem

Que tudo avança e são bem intencionados.

Mas sabemos meu amor,

“A maior astúcia do demônio,

Está em fazer-nos crer que ele não existe”

E agüentemos efeitos da camada de ozônio,

Danificada, arrasada, algo muito triste.

Mas você, meu criador de placentas,

“Clariceando o que há do bom”,

Com suas maravilhas infindas, atentas,

Me faz sentir que viver é um grande dom

Que Deus nos deu de presente

E mesmo que lá fora prevaleça o caos ostensivo,

Vivamos a felicidade, “uma arma quente”,

Contra o desespero, o medo, o veneno, o impulso depressivo.

Você é meu bálsamo, meu Deus que me acode,

E contra isso ninguém atingir pode,

Com seus ardis, trapaças e mentiras.

Eu e você, com nossa inesgotável sede de amor

Venceremos os canalhas, os vendidos, os tiras,

Enquanto nos alimentarmos mutuamente,

Enquanto mitigarmos nossa dor, esse horror

E esquecer essa gente, que rouba, mata, mente.

Para nós o amor é sempre eterno.

Gozaremos, viveremos nossos íntimos prazeres

E fugiremos desse torvelinho e inferno,

Que deprime, rebaixa e aturde os seres,

Até o juízo final chegar....

Mas enquanto isso, o que fazer, senão amar?

Nosso Máximo Amor Microfísico

Os podres poderes se instalaram,

Amor...

No Legislativo,

No Judiciário,

No Executivo,

Com honrosas exceções.

Será amor que essa gente,

Vai pensar com justiça em nós,

E ao fim e ao cabo,

Mas que diabos!

Não nos deixarão a sós?

Será que essa gente demente,

Sequiosa de grana e poder

(Seus afrodisíacos)

Legislarão,

“Judiciarão”.

“Executarão”,

Alguma coisa que seja boa realmente,

Para nós gays,

Com benignas leis,

Que protejam bem nossos direitos,

Que nos tratem com respeito?

Acredito que tão cedo não, amor,

Mas não soframos.

Lá no “não sabemos aonde”,

Está Focault que vela por nós.

Nos legou a “Microfísica do Poder”,

Que explica porque o nosso especial e legítimo

Viver...foder...viver...foder...

É tão caluniado, espezinhado,

Mas não vamos brincar de esconde-esconde,

Vivamos o que nos cabe,

Deixemos esses tolos de lado.

Vamos honrar nossos desejos íntimos,

Que não há nada que os acabe.

Larguemos para trás,

Esses animais irracionais.

Pra mim amor, acabou,

Não a esperança de sermos um dia

Considerados como semelhantes,

Mas a confiança nestes que aí estão.

Não fiquemos por eles, doentes.

Você é o que é, eu sou o que sou.

Nem tudo é para sempre:

Eles passarão

.

O que irradia,

Ao sol do dia a dia,

É nosso amor tão terno,

Que é eterno.

Identidade da Alma

O principal amor,

É assumir-se pra si mesmo.

Assumir para os outros,

Seja pai, mãe, irmãos,

Colegas, chefes, patrões...

É uma questão muito pessoal.

Cada um sabe o sofrimento e o prazer

De sua circunstância.

Assim cada um decide

Onde...

Quando....

Como...

Com quem...

Por quem...

Por quê...

Pra quê

Assumir

O importante mesmo,

É não fingir pra si mesmo,

Que se é,

O que não se é...

Ou que não se é,

O que se é....

Os outros que nos perdoem

Mas o que é fundamental é o nosso amor.

Só ele merece satisfações.

Perguntas

Macabéa pergunta em “A Hora da Estrela”

De Clarice Lispector:

“Ser feliz serve pra quê?”

Eu mudo a pergunta:

“Ter amor serve pra quê?”

E respondo logo:

Pra ser feliz,

Bem feliz!

Ao seu lado,

Meu querido namorado.

Macunaíma Acorrentado

Meu benzinho, meu amorzinho, me acuda!

( Será que estou precisando tomar banho de arruda?)

Sou Macunaíma sem tirar nem por:

“O Herói sem Nenhum Caráter”,

Vindo das entranhas da Amazônia.

Nasci preto, virei branco,

Sem sabê onde ir, onde vivê,

Banhado por águas do espanto,

Vim à cidade grande, perigosa e cruel.

Desci do caminhão com os bóias-frias,

das tão ansiadas goiabadas cascão.

Ouvi de não sei onde, algo que agora habita,

meus sonhos, meus pesadelos, meu matutar:

“Agora é cada um por si e Deus contra todos”

Nossa, isso me arrepia como um “Adeus!”

E tem sido assim minha saga,

Neste mar incessante de tentações,

Chorei, chorei, pelejei , pelejei

E depois de enfrentar carros, elevadores e até um gigante,

Procurei, procurei, procurei,

Andei, andei.

Aprontei, aprontei.

Mas quando minha muiraquitã já tinha sido recuperada,

Venceslau tornei ingrediente de feijoada,

Não sabia mais o que procurava,

Para onde andava, nem por que aprontava.

Só sei que numa noite escura,

Vislumbrei cê, lindo, onde estava.

Gente, cê não tinha medo não?

Aquela gente doida naquela escuridão,

Que confesso no começo me assustou.

Muita porra saindo de nós dois,

As coisas que você gritou.

Muito fogo, dentro do meu coração,

Ardeu, ardeu, depois me acostumei, viciei.

E lhi digo: Pra mata não volto mais não!!!

Não sei nada do que será depois.

Eu sei é que me saciei, me saciei, e ainda quero mais.

E porra! Não é que não tenho mais sossego?

Eu puxei cê lá com violência,

Com a força que empurrei o balanço,

Jogando o gigante na piscina,

Cheia de pedaços de pessoas,

Uma comida macabra que eu não lhe conto...

Acho inté que já lhi contei demais,

Pois não quero bagunçar nosso descanso.

Prefiro seu calor que alucina,

Seu tesão sem trégua que é de lascar,

Algo feito com jeitinho, manso, manso,

Continuo só pensando no seu chamego,

Juro: acabei com as mentira que sempre contei.

Por cê num tenho mesmo coragem

De continuá com essa mania que tinha, de sacanagem...

Eu quero esta, da outra forma,

Que me faz sentir tontinho

Como se tivesse me enchido de cachaça.

Eu não sou mais bobo, aprendi muito.

às vezes faz pirraça,

Mas sabe amorzinho, até isso eu acho graça.

Em cê, encontrei o verdadeiro muiraquitã.

O legítimo perto de cê, não vale nada não.

Eu que era bem louco, agora virei um pouco são.

Mas gosto de afagos, beijos, fodas, porra pra todo lado,

Continuei ainda safado, muito safado.

Mas agora é de um jeito bem diferente.

Tô inda cheio de preguiça e malícia,

Sentindo uma coisa que do meu controle foge,

Uma coisa que bole dentro da gente,

E cria um desvario, uma delícia

Que não me importa que a outros enoje.

Eu quero mesmo é me abrir todo pro cê,

Eu quero é viver muito ao seu lado,

Só cê traz no corpo o que gosto,

O que me apetece.

Adoro nós dois todo pelado.

Eu estou pro que der, vier e acontecê.

Menino, cê me acorrentou.

Me põe de tudo quanto é jeito,

A gente se deita, meu pau sobe, desce, lhe obedece..

Que eu acho que não lhi deixo mais não.

A corrente é muito forte, nunca arrebentô.

Um dia pode até mesmo arrebentá.

Eu vou chorá, chorá, chorá, muitas lágrimas soltá

Mas se cê me deixar, pra mata não volto mesmo não.

Vô esperá, doidinho cê voltá.

Mas se demorá muito, sabe o que eu faço?

Procuro um rio bem bonito e me atiro nele,

Pra correnteza levar toda mágoa,

Todos os carinho vivido,

Toda a porra desperdiçada, derramada daquele jeito.

(Olha quanto bebê que podia e não nasceu....)

Mas que valeu, valeu,valeu.

Não vou cuspi no corpo que comi e me comeu

E quando tudo de bom, de mal, de gostoso,

Que eu vivi com cê, com muito respeito,

For simbora rio abaixo, de bubuia,

Bichinho não pense que vô me afogá.

Eu sei bem o meu lugar, o meu direito.

Vou sair limpinho, branquinho.

( Preto num quero sê mais não:

aqui judiam muito deles, essa gente sem coração).

Eu vou juntar meus trapo, minhas coisinha,

De uma forma serena, delicadinha

E vô em busca doutro que sei, não vai sê igual a cê .

Vô até mesmo descê, subi, descê, subi no país

Pois pra mim num é possível que Deus não faça acontecê

De eu encontrar um cara boa praça,

Que me faça bastante feliz,

Que também me encha de alegria e de graça.

Eu mesmo com preguicinha vou a ele me acorrentá,

Igualzinho cê me fez fazê contigo,

(mas não esqueço, sendo sempre meu amigo)

E vou vivê, amá, trepá, gozá.

Ái que preguiça...

Mas disso num tenhu enfado não.

Vou seguir com esse novo amorzinho,

Té um dia a nova corrente arrebentá,

Mas vou chorá menos, vou seguir novos caminhos,

E pernas pro mundo,

Esse lugar tão vagabundo,

Em que a gente nasceu, viveu e vive.

Não vou murrê de saudade de belezas que deixei.

Vou construí uma nova lenda,

Uma lenda muito especial, mas que é só minha,

De mais ninguém, de mais ninguém

Eu apronto em qualquer lugar minha caminha.

(agora num gosto mais de rede)

Eu tenho mesmo muita sede, muita sede

De amor, carinhos, essas coisas que cê sabe bem.

Agora num perco mais tempo não,

Isto tudo ainda não aconteceu.

Vem pra mim seu putinho,

Tô cum saudade do seu jeito, seu carinho

e vamu trepá, fazê aquilo tudo:

cheirá, apalpá, chupá, gozá.

Vem, quero cê brincando, vadio.

Com os cabelinhos do meu peito.

A gente é igual a cadela no cio,

Pra que mentir, se enganar, se iludir?

É o que a gente gosta mesmo!

Vem meu bem,

Que ainda não é hora de eu fugir ou cê.

E agora chega! Silêncio!

Mas gemidos, sussurros, murmúrios, gritos,

Eu quero e muito.

Cê sabe que é muito bom!

(Tem gente que num sabe o que tá perdendu...)

E êta! Vamos fazê de tudo, mesmo ardendu.

Até punheta!

Já que a gente não gosta de buceta.

Vai sê algo muito bonito.

E não se esqueça, se controle,

Que eu quero mesmo algu que me bole!

Vamos esporrá juntinho com muito carinho.

Ah! Quanta preguiça!

Mas esse sou eu lá fora,

De cê, cê sabe, não tem preguicinha não.

Quero muito amor, enquanto cê num vai embora..

Vamos viver tudo isso mesmo na contramão,

Dessa gente tola, desinformada,

Que num sabe o que é bão.

Mas chega, cansei, vamos agi,

Vamos dar banana prô que essa gente faz!

E depois de tudo, de mansinho, devagarinho,

Vamus durmir juntinho, agarradinho.

(Talvez na madrugada eu acorde e lhi dê uns beijinhu)

Ái que gostoso! Tá gostoso coração tá?

Pra mata é que eu num volto mais não!

Como diz Dona Doida,

Com muito caráter:

Cu é lindo”!


http://www.meionorte.com/imagens/lorenanina/image/9f10453ad212d8fe2e6101b4e8f36458.jpg

http://www.febf.uerj.br/tropicalia/macunaima-poster02b.jpg

Nelson Rodrigues de Souza

5 comentários:

  1. Francisco Monteagudo9 de abril de 2009 às 22:44

    Curiosas, as poesias... Lemos uma após outra, e cada qual nos dá a impressão de um amor intenso, eterno... Há até o desejo de transformar o garoto de rua num agradecido amante para todo o sempre... Mas, como dizia Vinicius, "o amor é eterno enquanto dura"... e assim as paixões abrazadoras vão, uma após outra, virando cinzas e vivas lembranças de prazeres proibidos(ou não, depende da opinião).

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  2. FRANCISCO MONTEAGUDO11 de abril de 2009 às 00:04

    Há uns tempos atrás o Nelson escreveu que estava matutando uma poesia com base em "Macunaima"; agora as ideias concatenaram e lêmos "Macunaima Apaixonado". É interessante a utilização do romance clássico ser utilizado como mais um hino para o movimento gay; o desenvolvimento da trama vai num crescendo interessante; porém, faço duas observações: o texto procura dar um ar de "matuto escrevendo ou ditando"; porém as vezes o autor esquece e aflora o cultor da lingua portuguêsa sem erros; só um exemplo: estamos lendo, e aparece "vamo trepá"; logo depois, "vamoS esporrá"; um pouco depois, "vamoS viveR tudo isso mesmo na contramão" (bem, parece que o autor criou uma frase muito interessante, e não teve coragem de ser coerente, cortando SSS e RRR ou citando de modo mais "acaipirado", ou preferiu ser transgressor inclusive na construção do texto - óra dum geito, ora de outro. Outra observação: a última frase dá uma derrapada com relação ao texto todo; não há necesssidade de esclarecer o porque de Macunaima não sair mais da cidade - tudo o que foi escrito antes já nos informa sobre preferências e decisões.Era melhor ter deixado Dona Doida trancada no hospício.

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  3. FRANCISCO MONTEAGUDO11 de abril de 2009 às 00:13

    Vou criticar o crítico: JEITO é com J, não com G. É o que dá enviar textos sem tomar muita atenção nas palavras, e só querer explicitar as ideias.

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  4. Nelson Rodrigues de Souza11 de abril de 2009 às 08:56

    Francisco,

    De forma alguma poderia ter trancando Dona Doida no hospício. A citação ousada que faço tem tudo a ver com o estado emocional que crio em Macunaíma e vem de um poema da maravilhosa poeta católica não ortodoxa de Divinópolis que é Adélia Prado. Ente outras de suas heresias ela tem um verso fantático: "Deus não me fez da cintura pra pra Diabo criar o resto...".Fernanda Montenegro teve durante anos "Dona Doida", espetáculo sobre poemas de Adélia montado em várias praças brasileiras com muito sucesso, um cavalo de batalha.

    Quanto à linguagem de Macunaíma quis lembrar seu lado matuto mas não quis encorporar totalmente sua linguagem, pois o texto poderia ficar confuso e chato.Uma opção estilística que a Literatura nos proporciona, quando não almeja realismo estrito.
    Abraços,
    Nelson

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  5. Francisco e demais leitores,

    Corrigindo meu comentário acima: "Deus não me fez da cintura pra cima, pra o Diabo criar o resto"
    Abraços,
    Nelson

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