quarta-feira, 6 de março de 2013

O Cinema ao Meu Redor




"O passado é o que você lembra, imagina que se lembra, se convence que se lembra ou finge que se lembra"
Harold Pinter

O Cinema ao Meu Redor

 Caverna dos Sonhos Esquecidos  de Werner Herzog

Werner Herzog teve acesso. com câmera especial  3D para filmar o interior da Caverna Chauveu no sul da França descoberta em 1994. A caverna tem cerca de 400 desenhos e pinturas pré-históricas, datadas de 30 mil anos atrás. O acesso só é permitido a cientistas que passam por uma estreita passarela para observações, análises e teorias . As pinturas espantosamente remetem a  trabalhos contemporâneos , principalmente cavalos com patas a mais que insinuam movimentos cinéticos. O acesso restrito se deve ao fato de poder danificar pintura até mesmo com a respiração, o que aconteceu com raridades de uma caverna próxima.
Werzog filma tudo que pode com maestria e é o narrador e que  colhe depoimentos. O filme se ressente,  entretanto. por restringir as entrevistas a cientistas que tendem a fazer observações uniformes .A grande descoberta nos provoca indagações metafísicas e depoimentos de místicos e professores de História da arte enriqueceriam mais o filme que é muito bom mas não tem a estatura de vária obra primas do diretor. De qualquer modo é um trabalho autoral  pois o diretor continua com sua fascinante obseção em nos mostrar paisagens e  personagens que não conhecíamos, que não supúnhamos existir. O apogeu desta tendência, ao meu ver é o magistral “O Enigma de Gaspar Hauser”. Mas em resumo “ Caverna dos Sonhos Esquecidos” é uma iguaria cinematográfica que não se pode perder. Temos a possibilidade de fazermos uma grande viagem no tempo da espécie humana por muitos anos atrás e constarmos como a arte é fundamental. 

O Som ao Redor de Kleber Mendonça

O trabalho de Kleber é mais uma bela e grande constatação de que vivemos sob a égide de O Leopardo de Visconti  baseado em Lampedusa: “É preciso mudar para que tudo continue como está” . No início do vemos imagens fixas em  preto e branco de um casarão do interior e de gente paupérrima. Corte e estamos num playground de um prédio  onde crianças brincam de pedalar uma bicicleta . A maioria dos prédios da rua pertencem a Francisco ( W.J.Solha) e como são rodeados por favelas há muitas grades de segurança. Francisco mora numa casa. Milicianos aparecem quase impondo um suspeito trabalho de segurança. O chefe é vivido por Irandhir Santos em mais um desempenho arrebatador e camaleônico.
“O Som ao Redor” nos apresenta vários personagens em diferentes situações mas não é um filme coral  trivial e clichê . Um delicado quebra-cabeças  vai  se montando ao poucos. Uma mulher obcecada,,Bia (Maeve Jinkings)|  por eletrodomésticos e aparelhos como uma televisão não dorme direito  devido a um cachorro que vive latindo. Ela lhe atira um bife com soníferos e resolve o problema por um tempo. Na carência de transas com o marido ela parte para uma insólita masturbação com uma máquina de lavar, confirmando sua obseção . Também costuma fumar maconha para  aliviar as tensões. Seus dois filhos para um “grande  futuro” estudam tanto inglês como chinês . Um dos netos de Francisco, João( Gustvo John),  que viveu na Alemanha trabalhando da noite para o dia por sete anos agora é corretor de imóveis do avô, mas  primo seu mais novo , com ranços autoritários de quem será herdeiro deste latifúndio urbano e vertical  chega a a arrombar o carro da namorada João, deixando patente depois que faz outros roubos ,mas Francisco adverte os milicianos que não se metam com seu neto pois ele já está dando muito trabalho  ao pai . Francisco , “senhor de engenho da cidade grande” é dono da maioria dos prédios da região mas é o único que mora numa casa e com  sua  arrogância vai  tomar banho noturno no mar, numa  área em que está  bem visível uma placa que adverte que pode haver tubarões ali. Esta atitude já é mais um marco de sua prepotência..
Bia tem um aparelho importado que queima por descuido da empregada que não usou transformador para alterar a voltagem e  esta leva o maior esporro  mesmo que ela proponha  um  desconto em seu salário pelo seu erro. Uma mulher ao celular é mal-educada com um empregado e como vingança ele risca o carro dela.
Numa das sequências mais   significas da  mentalidade de classe média emergente tem-se uma reunião de condôminos de um dos prédios há o julgamento do destino de um porteiro que tem dormindo a noite e isto é comprovado por filmagens de um adolescente com os recursos dihaispsços digitais em voga. Há quem queira demitir o porteiro por justa causa sem pagar-lhe nada  pelos serviços prestados s durante anos. Uma mulher em mais um movimento de humor crítico do filme reclama indignada  que sua Veja tem vindo sem plástico.
Um das sequências mais significativas do filme  dá quando o neto e sua namorada vão ao casarão e tomam em conjunto um banho de cachoeira felizes e de repente a água fica avermelhada remetendo  a sangue caindo.
“O Som ao Redor” é um filmaço,  magnificamente dirigido com planos  próximos e distantes. movimetos de câmera de forma a pensarmos que não há outra forma de filmá-los . Claro que há. Tudo depende da sensibilidade do  autor para a  história  que deseja   contar e do clima que deseja criar.  Mas outras sensibilidades teriam outras opções. Mas a impressão que Kleber nos passa é o que indica seu talento como diretor.
Numa sequencia a filha de Bia vê vários meninos subindo uma árvore Alucinação ou realidade? Noutra em que o miliciano chefe transa num quarto de um apartamento vazio, vê-se um vulto passar bem rápido pela porta. Projeção do medo de serem pegos em flagrante num apartamento que não é deles?
Ao final temos o momento mais impactante do filme, fechando o quebra –cabeças até então. Mas mesmo assim temos um forte final em aberto.
“O Som ao Redor” está mesmo à altura dos elogios e prêmios recebidos tanto no Brasil como no exterior, sendo um retrato de um momento histórico com estética completamente diferente de “Terra em Transe”  (não tem nada de barroco),  mas trás um desencanto com  a sociedade brasileira que a rigor  não muda e como disse Cacá Diegues o filme de Glauber  Rocha  está sempre em cartaz. Será que com  “O Som ao Redor”acontecerá  o mesmo conforme vaticinei no início do texto? O filme aponta para o fato da ideia oficial de espetáculo do crescimento ser uma falácia. Vendo os Franciscos que ainda dominam e ditam a política brasileira num país no fundo neo- escavocrata, não há como não ter esta expectativa. Em “Noites do Norte” Caetano Veloso espantosamente põe música num texto de Joaquim Nabuco que ecoa até hoje: “A escravidão permanecerá por muito tempo como a característica nacional do Brasil”. Vale a pena conhecer o texto todo: http://letras.mus.br/caetano-veloso/568970/

Bárbara de Christian Petzod

Bárbara (Nina Hoss) de Christian Petzod tem problemas parecidos com “Morrer como Homem” de João Pedro Rodrigues , por mais diferentes em termos de estilo e temática. Ambos diretores/roteiristas sabem muito bem aonde querem chegar e constroem finais belíssimos para seus filmes . Não conto como são para o espectador usufruí-los. O problema surge quando assistimos a tudo que antecede estes finais. Ambos, me valendo de uma expressão popular me pareceram “enchendo linguiça”. 
Em “Barbara” temos a história de uma médica que na guerra fria queria ardentemente fugir da Alemanha Orienta,  sendo os dissidentes bastante vigiados pela Stasi conforme vimos no extraordinário “A Vida dos outros”. Há campos de trabalhos forçados e é para onde vai uma jovem que odeia viver no país tendo tido sucessivos internamentos. A única pessoa que a entende bem e tem muita paciência com ela é Bárbara que está ali naquele hospital de província como castigo por ter tentado fugir desta Alemanha super-autoritária e controladora. 
Barbara fica muito amiga de um médico que está ali por ter sido responsável por um acidente numa incubadora, morrendo dois bebes. Isto porque uma assistente confundiu graus Celsius com Fahrenheit. Ambos se solidarizam e criam forte amizade tendendo a paixão.
Bárbara é profissionalíssima a e não é fria , não perde a dimensão humana com seus pacientes. Uma médica assim é indispensável naquele hospital. Daí surge o conflito: no fundo quer abandonar o país sendo bastante vigiada pela polícia política, mas também tem consciência da falta que faria se deixasse o hospital. Até aqui uma ótima intriga, um ótimo conflito ético pessoal.  O problema vem quando o filme para mostrar o caráter forte de Bárbara, sua noção de ética, nos oferece uma overdose de cenas médicas que soam no conjunto um tanto desagradáveis.
Mas como vivemos num mundo em que noções de ética pessoal e profissional tem ido para o espaço, um filme como “Bárbara” torna-se indispensável.

Segredos da Tribo de José Padilha

Com “Segredos da Tribo”, sendo tribo antropólogos queimando na fogueira das vaidades, José Padilha conforma ser o mais importante cineasta brasileiro contemporâneo . Não existe filme dele que não seja superlativo, de “Ônibus 174” (um dos mais contundentes documentários feitos no país), passando pelos essenciais “Tropa de Elite”, Tropa de Elite 2” ( é sintomático que parte da crítica  tenha ignorado, desdenhado do Urso de Ouro que “Tropa de Elite” ganhou tendo como presidente do júri Costa Gravas, um dos papas do Cinema Político que escolhe temas contundentes mas não esquece da linguagem  cinematográfica, dotando seus filmes de fortes pulsões de interesse. Padilha fez ainda “Garapa”, um filme de doer os ossos mas alguém precisa mostrar que para combater a miséria precisa-se ir além de um bolsa família.
“Segredos da tribo” se estrutura em depoimentos de ianomanis que confirmam denúncias  feitas  e no campo acadêmico, principalmente na grande animosidade que existe entre Napoleon Chagnan  e Keneth Good. Existem outros depoimentos,  mas os destes são mais contundentes. Chagnan com vários livros publicados e estudados em cursos de antropologia cai em desgraça quando o acusam de ter cometido um genocídio com experiências  de vacinação contra sarampo. Seus livros passam a ser proscritos e ele com humor lembra que Galileu Galilei levou 400 anos para ser reabilitado pela Igreja Católica. Ele não pode esperar tanto tempo assim. Mesmo com todo este histórico Chagnan é homenageado na Associação de Antroplogia  Americana, onde se vê livros de antropologias dos mais variados. Neste momento Padilha permite ao filme uma trilha sonora bem humorada, numa ironia cortante.
Kenetth Good é acusado de pedofilia junto a uma menina ianomani.  Sua justificativa é que viveu bom tempo com os índios e isto era um costume deles e ele teria direito ao mesmo. Não via então sua atitude como pedófila. Chega a trazer com ele a menina para a “civilização”.
Há ainda Lizet que não quis dar depoimentos ao filme que é acusado de induzir índios a práticas homoeróticas.  Sobra até para Claude Lévi-Strauss,  tido como o melhor antropólogo do Século XX pois ele teria acobertado “mal-feitos” de um assistente.
Aqui não se trata de dizer que antropólogos não são santos. Nenhum profissional é. O que acontece com os antropólogos no filme é gravíssimo. Compromete muito o exercício da profissão no século passado.  Chagnan tem até suas estatísticas contestadas,  mas isto não poderia mais ser provado pois o tempo foi outro, a população já é outra.
Algo que se discute muito no filme é o porquê dos ianomanis entrarem em guerra. Uns tem a tese de que havia a busca por mulheres para aumentar o poder na tribo. Outros que havia carência de elementos para alimentação como carne. Enfim polêmicas não faltam .  Parece que estamos no reino de “Assim é se lhe parece” de Luigi Pirandello ou de “Rashomon” de Akira Kurosawa, onde diferentres  personagens tem versões divergentes para um mesmo fato. O que acontece em “Boca de Ouro” de Nelson Rodrigues também.
No lançamento de “Os Últimos Passos de Um Homem” de Tim Robins , sobre pena de morte, o diretor afirmou que a função do Cinema era abrir janelas para onde as pessoas não querem mais olhar. O cinema de José Padilha é assim. De Marcos Prado que divide produções com Padilha também é assim, como vimos no extraordinário “Estamira”.
Ps1. Há anos atrás quando trabalhava num convênio DAC/Infraero pensei em fazer mestrado na UFRJ tendo a intenção de depois ser professor por lá. Quando passei a conhecer as “panelinhas” que disputavam o poder entre si desisti.
Ps2 Um ex-colega do curso de Engenharia do Ita, bastante estudioso, com doutorado nos EUA ocupava um cargo elevado numa prestigiada universidade brasileira. Eu lhe perguntei o que poderia galgar mais. A resposta dele foi desconcertante,  mas ao mesmo tempo confirmava  o que eu intuía. Ele preferia ficar onde estava, pois as cobras dali ele já conhecia. Se subisse na hierarquia  teria que descobrir e lidar com novas cobras e suas artimanhas.
Conclusão: o que ocorre com antropólogos também acontece em outras profissões. Até hoje é um mistério do porque uma cantora extraordinária como Cláudia ficou treze anos sem gravar, surgindo recentemente com um belíssimo CD com canções raras, pouco conhecidas de Caetano Veloso, ficando com outro exemplo.

O Amante da Rainha de Nicolaj Arcel

“O Amante da Rainha” é uma agradável surpresa. Tudo sugeria um sonífero filme acadêmico, mas é puro classicismo, estruturado por um ótimo roteiro ( premiado no Festival de Berlim -2012),contando ainda com atores formidáveis: Rainha Caroline (Alicia Vickander ) que veio da Inglaterra de forma  imposta para se manter boas relações com a Dinamarca ,ocorrendo o casamento em 1776 com um insano Chrstian VII( Mikkel Boe Folsgaard, premiado em Berlim 2012 como melhor ator) que precisa da ajuda do médico alemão Johhan Strueense ( Mads Mikklsen).
O médico ao mesmo tempo em que cativa o Rei, levando-o até  a bordéis, procura incutir-lhe ideias Iluministas numa Europa que vociferava contra os regimes absolutistas apoiados pela Igreja Católica como foi o caso da Dinamarca. Os dois desenvolvem uma amizade sincera. Diante de uma corte que tenta boicotar suas ideias avançadas que alega falta de dinheiro, quando dão voz de prisão ao médico, o rei dissolve a assembleia e introduz Struense como seu único auxiliar e conselheiro.
No entanto a rainha (que já tinha um filho com o rei) e o médico se apaixonam, tornam-se amantes e ela fica grávida novamente sem que o rei tenha lhe tocado há um ano. A partir daí o drama que parecia algo mais intimista ganha ares épicos, com muitas intrigas palacianas. Desde o início sabemos que a história não terminou bem, pois a rainha no exílio escreve uma carta para os filhos. Da Idade Média com as reformas de Struense apoiadas pelo que vislumbrou no Iluminismo, a Dinamarca passa a ter um novo padrão de vida para seu povo, com o rei apoiando também. Com a desgraça do médico regride à Idade Média e  segundo o letreiro final só é eliminada a nobreza cruel e parasita 55 anos depois dos trágicos acontecimentos, pelo filho da rainha.
Com belíssima reconstituição de época, fotografia exuberante, “O Amante da Rainha” foi candidato selecionado para o Oscar de melhor filme estrangeiro pela Dinamarca ,  mas “Amor” é realmente algo de outro mundo e este filme do qual tratamos aqui é muito bom mas está longe de chegar a tanto.

César Deve Morrer de Paolo e Vittorio Taviani

Na prisão de segurança máxima de Rebbibia na periferia de Roma há detentos com os mais variados delitos: furtos, assassinatos, colaborações  com a Camorra, etc. O que diferencia  esta prisão de outras é que ali parte dos presos pratica a arte teatral. Os irmãos Taviani não fizeram um doc e sim um filme que se aproxima do teatro. De início vemos uma representação de sucesso do grupo de presos para Julio Cesar   de Shakespeare.  Terminada a peça, depois dos aplausos, voltam todos para suas celas.
De início o que vemos é a cores, com destaque para Brutus pedindo que lhe matem, pois ao mesmo tempo que queria o melhor para Roma , era amigo de Julio Cesar, daí vindo a célebre frase que teria sido dita por Julio em seus estertores: “Até tu Brutus?”
Esta parte inicial talvez seja mesmo um doc, mas os ensaios seis meses atrás  em preto  e branco feitos  em longos corredores são dirigidos tanto pelo diretor da peça na prisão quanto pelos Tavianis. Para adequar prisioneiros a personagens, eles são instados a um pequena performance: dizer nome , data de nascimento, endereço, nome do pais, numa ocasião em que lhe pedem  isto com carinho e noutra em que é feita com brutalidade . Os temperamentos bem diferentes projetam na tela uma comovente humanidade ( característica dos Taviani),  para arrepio daqueles que desejam pena de morte para os presos.
Numa das partes do ensaio um dos atores sai do texto e passa a acertar conta com seu antagonista. Chegam até a sair de um recinto para resolverem divergências na porrada. Os outros presos saem para apartar  um briga que não vemos. Uma curiosidade fica no ar:  estas cenas de desentendimento são reais ou encenadas?
Julio Cesar é uma peça que cai como uma luva para os presos  representarem,  pois  há nela todo um lado sombrio da alma humana: a disposição para o assassinato por um suposto bem maior,  coletivo ( no caso libertar Roma de um tirano), desejos de vingança, arrependimento ambíguo ( que é o que acontece com Brutus que por isso quer morrer e acaba encontrando um colegionário que atende seu pedido).
Os assassinos fogem e são perseguidos por centuriões  chefiados pelo filho de César e numa estrutura circular vemos as pessoas chegarem ao teatro e aplaudirem os atores que fazem uma festa no palco. O colorido voltou assim como os presos voltam todos às suas celas. De dentro de uma das celas em forma frontal, o que indica que os Taviani tiveram permissão para filmar lá dentro, um preso declara algo que deve servir para seus colegas atores: ”Desde que conheci arte esta cela se torno uma prisão”. 
Sem estar no nível de obras-primas dos irmãos como “Pai Patrão”, “A Noite de São Lourenço”, “Kaos”, etc., “César deve Morrer” é uma mais que uma bem vinda volta deles à tela grande, pois eles tem trabalhado mais para a televisão.
Ps1 Tive oportunidade de assistir uma conversa com eles no MAM nos anos 70/80. A unidade de pensamento me impressionou. O que um dizia era complementado pelo outro sem nenhum traço de descontinuidade e vice-versa. .
Ps2 Há poucos anos atrás assisti com a presença de um dos irmãos a “La masseria delle allodole” , sobre o massacre dos armênios pelos turcos. Tem uma das cenas mais impactantes do cinema. Sabendo que ela e seu filho pequeno irão morrer nas mãos dos turcos, uma mulher prefere sacrificar antes sua criança. Assim fica com uma amiga de costas  uma para outra e esmagam a criança. Nosso miserável circuito exibidor jamais se interessou pelo filme, mesmo com a importância dos cineastas para o cinema contemporâneo. Uma série deles feita para a televisão poderia ser exibidas  nos cinemas em versão reduzida como aconteceu com “Cenas de Um Casamento” e “Fanny e Alexander” de Bergman..
Ps3 Encontra-se fácil o DVD de Julio César na versão de Joseph L. Mankiewicz. É um daqueles filmes incontornáveis, conforme acepção dos franceses. O discurso de Marco Antônio (Marlon Brando) para o povo romano diante do cadáver de César é um dos momentos sublimes e superlativos do cinema, embora sempre achemos os chatos de sempre que  vão dizer que é tudo teatral demais. Vai saber.

Para Não Dizerem Que Eu Não Falei do Oscar.

O Oscar antes de tudo é uma festa, uma celebração do Cinema. Eles cometem injustiças claro, mas é preferível que isto ocorra ( o que acontece também em Festivais como Berlim, Cannes e Veneza) do que não haja festa nenhuma. O grande problema está mais no público  no que nos acadêmicos  de Hollywood. Estes não dão a mínima para o César, o David D’Donatello, o Bafta, o European Film Awards, etc. Os jornalistas também pois ante da premiação escrevem muito sobre os concorrentes e depois, com exceções, não se dão ao trabalho de fazer comentários além de que houve piadas de mal gosto de sempre.
 E o Brasil que criou o Grande Premio  do Cinema Brasileiro..... Pra que este nome longo explicativo e  óbvio? Poderíamos ter o Glauber, o Oscarito ( uma apropriação de influência Oswaldiana com seu manifesto antropofágico). Por que este prêmio é distribuído de forma tão tardia, não alavancando em nada o faturamento destes filmes premiados no Cinema. Para se ter uma ideia a festa relativa aos filmes de 2011 só foi realiada em 15 de outubro de 2012 onde por exemplo concorriam a melhor filme de ficção:”Assalto ao Banco Central” , “ Bróder” ,”Bruna Surfinha”, “O Home do Futuro”,” O Palhaço”. Me poupem.  Será que estão mesmo é interessados em alavancar a venda de DVDs? É obvio que esta premiação dever ser feita em janeiro ou fevereiro de uma ano sobre os filmes do ano anterior.
Oscar 2013

Amor “de Michael Haneke

Amor “de Michael Haneke deveria ter ganho todos os prêmios ao qual concorreu  ( filme, diretor, atriz,  roteiro original, filme estrangeiro) .Mas seria demais esperar isto de um filme tão corajoso e singular como é “Amor” que ganhou o esperado Oscar de melhor filme estrangeiro. O Bafta reconheceu o trabalho extraordinário de Emmanuelle Riva,deixando de fora as favoritas Jessica Chastain ("A hora mais escura") e Jennifer Lawrence ("O lado bom da vida") .
O que é o filme de Mihael Haneke? É o que diz o título: uma história de “Amor”com A maiúsculo . Mas até as suas últimas consequências. Só a sequência em que Jean-Louis Trintignante olha para a mulher na mesa e vê no rosto sinais de paralisia (o que gerou dois cartazes publicitários belíssimos: um sobre o ponto de vista dele, outro sobre o dela) já vale o filme. O que se vê depois é uma progressiva degeneração onde a mulher pede ao marido que jamais a ponha num hospital. Ele contrata duas enfermeiras e demite uma por julgá-la incompetente. O desfecho do filme é super-impactante, mas está totalmente de acordo com a história que vinha sendo contada até então. É a morte como ela é. É natural então que Haneke mostre sua personagem debatendo-se com as pernas. Logo de início vemos bombeiros entrando  na casa, arrombando-a e com máscaras pois temos um corpo em decomposição  O que vemos depois é um longo flashback .
O Cahiers Du Cinéma considerou que mesmo aqui, num filme que trasborda humanismo, o diretor de filmes polêmicos como “A Fita Branca”, Caché”, “Violência Gratuita”, “A Professora de Piano ( todos filmes do quais gosto muito)  Mike Haneke mostra-se um misantropo ( uma pessoa que odeia a humanidade) . Ora é uma piada e vamos responder aqui com uma piada: pelo menos com Isabelle Hupert ele tem relações. Ela mais uma vez trabalha com ele , sendo a filha do casal de musicistas aposentados que se vê mais do que impotente para ajudar os pais. Ela é malcasada com um inglês. Em sua relação não há o amor que os pais se devotam, num contraponto elucidativo das intenções do diretor.
Deixando “Amor” hors concours. o filme que mais gostei foi “Django Livre” de Quentin Tarantino.  Com um roteiro extraordinário ( premiado com um Oscar), locações impecáveis,  fotografia esplêndida, montagem exuberante, com uma  história em que nunca se sabe ao certo para onde vai, fazendo a paródia da paródia  que eram os westerns espaguetes, temos diversão e reflexões de primeira qualidade.  
Há aqui a sanguinolência típica de Tarantino, mas ela é ambígua como nos outros filmes do diretor: ao mesmo tempo em que temos os efeitos sérios de confrontos com armas, há um lado até risível e paródico do outro. Numa outra chave é o que faz Pedro Almodóvar com os melodramas. Ele se apropria de um lado kitch que temos até em Douglas Sirk, o papa do gênero e imprime muita verdade em suas cenas. “Tudo Sobre Minha Mãe”, ao meu ver , é o auge deste dispositivo.
Anos antes da abolição da escravatura, um caçador de recompensas alemão encarnado por Christoph Waltz (Oscar de ator coadjuvante) liberta o escravo Django com a condição de que ele o ajude a encontrar dois irmãos que lhe trarão recompensa. Ao mesmo tempo vai adestrando Django com um revolver. Resolvida esta questão os dois partem para libertar a companheira de Django com origens alemã também (uma grande coincidência de roteiro que um filme paródico se permite) fazendo passar-se por compradores de mandigos ( escravos que lutavam até a morte). Há quem diga que estes nunca existiram. Mas aqui estamos no terreno de John Ford: “quando a lenda é mais forte do que a verdade, imprima-se a lenda”.  Para isto os dois tem de travar contacto com um personagem de Leonardo Di Caprio (excelente, numa chave bem diferente da que o temos visto até então), que adora esta luta de escravos, oferecendo até instrumentos para o vencedor matar de vez o vencido. A companheira de Django , agora um exímio pistoleiro, está presa e maltratada neste  cenário. Um jogo de gato e rato se inicia.
Django Livre mesmo com seu espírito “não me levem tão a sério assim” não deixa de ser um retrato candente das condições sub-humanas em que os negros viviam.
Não vi “O Lado Bom da Vida”, pois não acho graça nenhuma sobre a descoberta amorosa entre dois portadores de Síndrome Maníaco-Depressiva. Vi o musical “Quase Normal” dirigido por Tadeu Aguiar e é uma peça espantosa: além das belas canções que impulsionam a narrativa, trata o tema da bipolaridade com a maior seriedade. Duvido que o trabalho de Jennifer Lawrence (premiada como melhor atriz) supere  por exemplo o de Jessica Chastain em “A Hora Mais  Escura”. Este ao meu ver foi o filme mais injustiçado da noite, mais ainda do que “Lincoln”.
“A Hora Mais Escura” de Kathryn Bigelow está ganhando vários prêmios de Associações críticos  nos Estados Unidos. Estes não se deixaram levar pelo erro quer assolou “Tropa de Elite”: confundir diretor com personagem. O filme vai mostrando paulatinamente o porquê da agente da Cia ficar cada vez mais obcecada pela caça a Osama Bin Laden. Chega a mostrar cenas de tortura durante o governo Bush logo de início. Durante o governo Obama, um agente da Cia lamenta que a tortura não pode mais ser empregada para obter informações preciosas. Mas aqui não temos a visão da diretora e sim de um personagem seu.
A tomada da casa mesmo que  vejamos pela ótica dos soldados que usam óculos para enxergar no escuro não deixa de mostrar o apavoramento de mulheres e crianças, sendo uma mulher morta de modo absurdo. Mas um dado de Kathryn para mostrar a falibilidade da Cia. É a agente da Cia  que confirma que o homem capturado é Bin Laden. A rigor os soldados não tinham certeza se realmente capturaram “o homem mais temido do planeta”. Algo que o filme mostra é como a Cia tinha/tem bases mundo afora além de Guantánamo, mas também na Polônia e Paquistão. Além da temática solidamente desenvolvida temos uma pulsação cinematográfica que nos faz não despreender  os olhos da tela por um segundo que seja.
Não há como comparar “Argo” de Ben Afleck com “Django Livre” “ A Hora Mais Escura”. “Argo” é um filme ok, não mais que isto. De início somos informados de que os americanos interessados em petróleo eram comparsas da ditadura do Xá Reza Pahlavi. Mas depois que o filme começa com o governo do fanático "ayatollah" e chefe de estado iraniano, Ruhollah Khomeini , após uma revolução os iranianos, todos são considerados como fanáticos e veremos a luta do bem ( pessoas americanas que escaparam do ataque de uma multidão e se isolam na embaixada do Canadá, agentes da Cia) e iranianos malavados que enforcam pessoas em guindastes. A partir daí temos uma história em a Cia fica bem na ficha ao concordar que o agente vivido por Afleck leve adiante seu plano mirabolante de ir ao Irã fazer um filme, Argo, uma sub-ficção científica de quinta categoria, convencendo as autoridades iranianas de que os americanos presos na embaixada fazem parte da equipe de filmagem. Este fato real tinha sido escondido por algum tempo e depois revelado. Um dos problemas do filme é que se Ben Afleck domina o trabalho de direção, como ator é um tanto inexpressivo, ficando o tempo todo com uma expressão só que muda apenas quando revê a família ao final.Qualquer ator presidiário de “César Deve Morrer” é mais expressivo que Bem. Dito tudo isto pode-se afirmar que “Argo” é um filme de ação que se vê bem mas de modo algum merece a consagração que teve como melhor filme, roteiro adaptado e melhor edição.
Foi uma grande surpresa Ang Lee ganhar o Oscar de melhor diretor com “As Aventuras de Pi”. Com “Brokeback Mountain” ganhou também como melhor diretor e merecia ainda o de melhor filme, dado ao bastante inferior  “Crash-No Limite”. O grande trabalho de direção em “As Aventuras de Pi” são dos responsáveis pelos efeitos especiais ( estes sim mereceram o Oscar). Estou entre aqueles que não se incomoda nem um pouco com a versatilidade de Ang Lee( não levo a ferro e fogo as lições de autor do Cahier Du Cinéma) que já nos deu tantos filmes diversos como “Razão e Sensibilidade”,”O Banquete de Casamento”,“Desejo e Perigo), “Tempestade de Gelo”, “O Tigre e o Dragão”, etc.  Este “Pi” é o que me interessa menos . Uma das razões é o tempo excessivo em que há o embate entre o rapaz e o tigre na embarcação. Eles acabam indo depois de muito tempo para um ilha coalhada de bichinhos,  mas Pi descobre que é uma ilha carnívora e chama o tigre para voltar com ele. O tigre fica e logo aparecem pessoas para socorrer Pi. Uma outra história nos é narrada de forma muito rápida e depois somos instados a escolher  qual história é real. Ang Lee quer que vejamos o filme de novo. Mas terei de levar algo para enjoo. Se não saímos do cinema  mais espiritualizados como deseja Ang Lee, temos diante de nós apesar das imperfeições um espetáculo que se impõem e vale a pena ser visto.
“Lincoln”, dizem, é uma grande surpresa na carreira de Steven Spielberg. mas não é. “Munique”, “O Resgate do Soldado Ryan”, A Lista de Shindler” assim como os subestimados “AI-Inteligência Artificial”, “Minoryt Report-A Nova Lei” etc. já tinham uma grave uma capa  sob  um suposto escapismo. Há os que tenham afirmado que os melhores Spielberg são “Tubarão” e o primeiro “Indiana Jones”. Pelo amor de Deus. Respeitemos as diferenças mas aqui é demais.
O que nos causa estranheza em “Lincoln” é o lado bastante teatral e a ênfase no trabalho dos atores. Mas temos cenas externas de guerra que valem por várias. Lincoln vencedor dos seus desejos passeando entre vários cadáveres é coisa que não se esquece. Lincoln, esplendidamente vivido por Daniel Day- Lewis ( ganhando seu terceiro Oscar merecidamente; os outros  foram por “Meu Pé Esquerdo” e “Sangue Negro” ) desejava de uma vez que fosse aprovada uma emenda que ao mesmo tempo acabasse com a guerra civil e escravidão dos negros. Curiosamente na época os republicanos eram mais progressistas que os democratas. Aprovar apenas uma lei que acabasse com a guerra, sabia Lincoln que os Estados do Sul se  reorganizariam , mas manteriam a escravidão. Para isto não hesita em aplicar a chamada Realpolitk, promovendo benesses a quem apoiasse a emenda que ele desejava. Para isto chega a bater na mesa com energia. Assim conseguiu que ao mesmo tempo se acabasse com a guerra e com a escravidão, algo que difere muito do nosso mensalão onde a Realpolitk se deu para tomada ou manutenção no poder. O mais importante em “Lincoln” é que não temos uma hagiografia.
Será que se os vencedores fossem “Django Livre” ou “Lincoln”ou ainda   “A Hora Mais Escura” teriam chamado Michele Obama para entregá-lo. Isto confirma que “Argo” tem um quê de patrioteiro. Não muito, mas tem.
 “Os Miseráveis” deTom Hooper é um musical exuberante do começo ao fim, sem respiro. Se alguns momentos não soassem piegas (o desfecho principalmente) o filme seria melhor. Há também algumas quebras de roteiro: quando o ex-prisioneiro Jean Valjean (Hugh Jackman) por ter roubado um pedaço de pão resolve dar a volta por cima acaba ficando rico. Mas como este milagre aconteceu? Quando está convidado a escolher entre a vida e a morte estava doente de quê?
 Russell Crowe é Javert, perseguidor implacável de Jean e tem  "Physique du Rôle" bastante adequado para o papel e canta bem. Mas para um personagem bastante presente seria necessário cantar melhor ainda. Hugh Jackman se sai bem melhor: tudo é adequação nele.
O prêmio de melhor coadjuvante para Anne Hathaway é mais do que merecido. Sua entrega ao anjo caído Fantine que vê a vida passar de uma forma muito longe dos seus sonhos é arrebatadora e comovente.
“O Mestre” de Paul Thomas Anderson é um filme bastante estranho. O  duelo de interpretações entre  Joaquin Phoenix e Philip Seymor Hofman é o que o filme tem de melhor. Dizem que o filme foi levemente inspirado pela  cientologia a qual pertencem astros como Tom Cruise e John Travolta. Mas mesmo “este levemente” compromete a cientologia. O que temos no filme chamado de A Causa é um samba do criolo doido aplicado ao Kardecismo com ares científicos. Só um ator do calibre de Seymor para dar credibilidade a Lancaster Dodd, o mestre de A Causa.
Estamos nos anos 50, depois de segunda guerra mundial . Freddie Sutton vivido por Joaquin com grande intensidade e verdade acaba tendo seu caminho cruzado com Dodd. Por acaso ou porque assim estava  escrito?  Os dois passam a ter uma ligação obsessiva. Há um clima de homoerotismo no ar, pois Dodd passa a esquecer seus adeptos endinheirados ( a mulher de Dodd é que passa a fazer isto) e se concentra numa relação tortuosa com Freddie. Este chega a agredir um editor que diz que não vai publicar um livro de Dodd. Ou este homoerotismo é de vidas passadas?
Há algumas sequências em ficamos de início em dúvida se é realidade ou imaginação dos personagens. A mais evidente é quando as mulheres numa sala passam a andar nuas. Logo percebemos que é imaginação de Freddie. Mas o que isto realmente acrescenta ao filme?  Sinto-me pesaroso ao dizer que nada para um diretor que já nos deu os extraordinários “Magnólia”, “Sangue Negro e o muito bom “Boogie Nights”. Li que “O Mestre” foi feito para uma tela grande. Seria muito mais belo em suas imagens. Eu o assisti na acanhada sala 2 do Estação Botafogo e com ar condicionado ainda com problemas. Se o circuito exibidor (  o que eu duvido) exibir o filme nas condições desejadas sou capaz de dar uma nova chance ao filme. Mas acredito (posso estar enganado) que a essência de minha crítica se mantenha.
Correndo por  fora no Oscar houve um filme bastante inspirado e poético que é “Indomável Sonhadora”.Uma menina de por volta de 6 anos, Hushpuppy ( Quenzhané Wallis) vive com seu pai Wink (Dwight Henry) numa região bem pobre,  numa embarcação que chamam de a banheira. A história nos é contada por monólogos  interiores da menina. Isto fez com que aproximassem o filme de Benh Zeitlin ( Câmera de Ouro no Festival de Cannes para melhor diretor estreante) com os de Terrence Malick.Há  a fixação por monólogos interiores sim mas “Indomável Sonhadora” tem um frenesi, um corre corre que não vemos em Malick. Não temos aqui um filme realista mas sim que flerta com a poesia. Assim vemos a menina passar pelos maiores perigos e sobreviver. Numa sequência inicial ela solta fogos e isto num sentido inverso remete à famosa foto da menina correndo do Napalm  no Vietnã, notou com razão um crítico de Globo.
 Ébrio, muitas vezes o pai maltrata a filha. Mas quando fica doente não quer ficar no hospital e amplia sua relação com ela. Indomável sonhadora” é um filme que não veio para mudar a história do cinema mas acrescenta pontos para os filmes que são pura poesia em imagens.
 
Melhores Filmes Vistos em 2012 no Circuito Exibidor.

Por problemas de saúde não pude acompanhar os filmes lançados o ano todo. Assim dentre os que vi, cito sem ordem de importância:

Pina de Wim Wenders
Luz nas Trevas- A volta do Bandido da Luz Vermelha de Helena Ignez e Icaro Martins

A Separação de Ashgar Farhadi

Noite de Sombras de Tim Burton

Deus da Carnificina de Roman Polanski

Shame de Steve McQueen. 

 Aqui é Meu Lugar de Paolo Sorrentino

 Habemus Papa de Nanni Moretti

 O Homem Que Não Dormia de Edgar Navarro

L’Apolonide – Os amores da casa de tolerância de  Bertrand Bonello

A Febre do Rato de Cláudio Assis

Rock Brasília de Vladimir Carvalho

Tropicália de Marcelo Machado

Na Estrada de Walter Salles

Corações Sujos de Vicente Amorim

Cara ou Coroa de Ugo Giorgetti

Um Método Perigoso de David Cronenberg

Cosmópolis de David Cronenberg

7  Dias Com Marilyn de  Simon Curtis

À Beira do Caminho de Breno Silveira

O Artista de Michel Hazanavicius


Uma Longa Viagem de Lúcia Murat

A Maior Decepção

“Fausto de Alexander Sokurov, ganhador do Leão de Ouro no Festival  de
Veneza.
O ambiente mostrado é por demais sombrio. Por isso é que quando chega ao Inferno após a cobrança do diabo (caracterizado com um rabo ridículo), Fausto ouve de um os mortos que prefere o ambiente ali do que o da Terra.O uso da tela quadrada foi, ao meu ver, um tiro pela culatra. Com a visão do mundo contemporâneo de que muita gente vendeu a alma o diabo  concordo.Mas com a estética que diretor utiliza para dar força à sua história não. 

Nagisa Oshima- O Maior dos Transgressores

Morreu este ao em janeiro, com 80 ano, de pneumonia um maiores cineatas  de todos os tempos. Antes já havia sofrido um AVC que o impossibilitou de continuar filmando.
Nagisa conseguiu um prodígio que nenhum cineasta havia logrado antes: um filme passado quase o tempo todo numa cama onde dois personagens transam o tempo todo, sem o menor vestígio de pornografia com planos perfeitos para capturar “O Império dos Sentidos” em que Sada (Eiko Matsuda) e Kichizo (Tatsuya Fuji) vão até as últimas consequências radicalizando a ideia de que o orgasmo  e a  pequena morte. Estamos em 1936 e quando um batalhão de soldados desfila por rua, Kichizo está caminhando em sentido contrário, sozinho.  O que faz a grande diferença entre este os filmes pornôs é que no filme de Oshima transparece muitas emoções, o que os filmes pornôs não têm, parecendo sessões de ginástica e com ângulos filmados grotescos, para dizer o mínimo.  Esta grande obra-prima do cinema mundial abriu espaço para que  Patrice Chéreau filmasse o belo “Intimidade” com muitas cenas de sexo explícito e que Ang Lee introduzisse em seu esplêndido “Desejo e Perigo” cenas de sexo explícito também, ainda que sejam mais esporádicas. Para quem achar o final de ‘O Império dos Sentidos” demais é bom lembrar que o filme é inspirado numa história real, onde uma prostitutas foi encontrada vagando louca com o pênis decepado de  um amante. .
Em “O Império da Paixão Nagisa Oshima faz um contraponto a “O| Império dos Sentidos”. Há aqui uma dimensão maior da paixão dos amantes do que do desejo. É por isso que Seki e Toyoji matam o velho Isaburo, marido da jovem. Com o que não contavam é que o falecido voltaria como fantasma a atormentá-los e nem que a polícia iniciasse um inquérito. Será a paixão que dois sentem suficiente para enfrentar estas agruras, principalmente morando num pequena aldeia “onde tudo se sabe sobre a vida alheia”?
Em 1983 Nagisa Oshima volta a surpreender com o sensacional “Furyo-Em Nome da Honra”( “Merry Christmas Mr. Lawrence”). Os japoneses fizeram de ingleses prisioneiros mas o chefe Capitão Yonoi ( Ryuichi Sakamoto), passa a nutrir uma  forte paixão homoerótica pelo Major Jack 'Strafer' Celliers (David Bowie) e este, ambíguo e sibilino percebe esta pulsão sexual desviante, passando a sentir o mesmo. O          Coronel John Lawrence (Tom Conti) passa a ser o elemento conciliador entre os  dois universos, desenvolvendo forte amizade com  Sargento Gengo Hara (Takeshi Kitano, futuro grande cineasta). Numa das sequências mais atordoantes temos por amizade Gengo perguntando para Lawrence, sem nenhum cinismo : Mas porque é que você não se matas?”.
Yonoi começa a matar ingleses indiscriminadamente. Chega então a reunir dois pelotões. Um inglês atrás com muitosw feridos e outro japonês na  frente. O que se segue a seguir é uma das grandes cenas do cinema. Se você leitor prefere saber depois que ver o filme em DVD  é bom parar por aqui. Celliers sai do seu lugar é vemos seu caminhar em câmera lenta, aproximando-se de Yonoi e dando-lhe um beijo na boca, que era no fundo o que mais desejava o japonês. Mas como o  espírito de honra deve permanecer Celliers é todo enterrado, só com o pescoço  pra cima  de fora e deve morrer de insolação.
Terminada a guerra, Lawrence vai visitar Gengo na prisão. Depois de trocarem algumas palavras e o primeiro sair, ouve de Gengo uma frase que explica o título original do filme: Merry Christmas Mr. Lawrence. Oshima definiu seus filme como “O Beijo do que o Ocidente deu no Oriente”. A trilha sonora de Ryuichi Sakamoto é uma das mais belas da história do cinema pontuando os momentos dramáticos com muita força. O filme só não ganhou a Palma de Ouro em Cannes porque surgiu um filme ainda mais fundamental que é “A Balada de Narayama” de Shohei Imamura. outro cineasta japonês bastante inconformista.
O seu último filme foi “Tabu” que se não é uma obra-prima como os outros é bastante interessante e revelador. No universo dos samurais a homossexualidade é permitida desde que os samurais envolvidos sejam grandes guerreiros. Um jovem efeminado samurai, Kano, chega a um clã. Ele é muito corajoso e cruel com os inimigos. O problema surge quando ele passa a ser disputado por dois samurais.
Dos filmes anteriores vi no MAM por acasião de uma visita de Nagisa Oshima para lançamento de Furyo-Em Nome da Honra”  três filmes. Dos depoimentos lembro pouco. Apenas que ele pagou uma refeição a Glauber Rocha, talvez em Paris. Será que a tese de Paulo Francis de que os amigos de Glauber o abandonaram tem sentido? Cheguei a ouvir o psicanalista Eduardo Mascarenhas  dizer na televisão que quando Glauber procurou a psicanálise já era tarde. Glauber aprontou um auê no Festival de Veneza porque seu filme “A Idade da Terra” perdeu para nada nada menos de Louis Malle(Atlantic City) e John  Cassavetes (Glória. um filme eletrizante que influenciou “Central do Brasil”). Irônico é que Glauber apresentou à imprensa uma lista com os cineastas que considerava neo-acadêmicos e nesta lista estava Nagisa Oshima, Bernardo Bertolucci. Nelson Motta escreveu “A Primavera do Dragão” sobre o jovem Glauber. Seria interessante que pesquisassem muito bem e escrevessem “O Outono do Dragão”.
Mas voltemos ao filmes de Nagisa Oshima.  Em “A Cerimônia” o noivo ou a noiva ( não me lembro ao certo) faltam à cerimônia de casamento e tudo é encarado com falsa naturalidade e o ritual todo da cerimônia é feito mesmo que com a presença de um só dos noivos, revelando o automatismo da sociedade japonesa. Noutro filme um soldado americano negro é capturado pelos japoneses, preso a uma árvore e sofre horrores nas mãos de crianças. Noutro mais poético um garoto vende um pombo que acaba  sempre voltando para suas mãos,possibilitando-o a novas vendas. Uma cliente acaba se aproximando dele e desvendando o truque.

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http://migre.me/dyO1L A Cerimônia 

Nelson Rodrigues de Souza


Um comentário:

  1. Querido Nelson .
    Que bom ler os seus texto. Eu gosto de assistir a todos os premios . Vejo o Oscar ,Globo de ouro ,Bafta , Goya ,Cesár, abertura e encerramento do festival de Berlim e Cannes , até o Tommy eu assisto .O oscar só tem essa importancia no Brasil ,porque aqui nem passa na tv aberta e ninguem fala depois de 2 dias .
    Vi O Som ao redor logo que ele estreiou aqui e isso aconteceu muito antes do Brasil . É um filme que mostra muito bem a sociedade escravocata brasileira . Alguns holandes me perguntaram se no Brasil eu tinha empregada .Babás ,empregadas ,porteiros , frentitas ,assesoristas de elevador etc.. isso não existe na Europa e quando existe é uma coisa muito rara . A pessoas aprendem desde cedo a ser independentes por aqui.É uma outra cultura muito diferente do Brasil .
    O Brasil quer entrar para os paises do primeiros mundo ,mas ele se esqueceu que isso tem o seu preço .
    Vi Life of Pi mas não consigo gostar do filme sabendo que ele é baseado num livro que é um pragio de um livro de um brasileiro .Meu orgulho nacional fala mais alto. Eu não consigo ver essa esperitualidade que todos falam ,eu vejo muito mais o menino e a ferra da ditadura como livro brasileiro .

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